Clientes têm usado as redes so-
ciais para denunciar uma nova
forma de golpe via Pix. Usan-
do informações resguardadas
pelo sigilo bancário, como mo-
vimentações da conta corren-
te, os bandidos fingem ser fun-
cionários das instituições fi-
nanceiras, conquistam a con-
fiança da vítima e tentam apli-
car o golpe, pedindo transfe-
rências e depósitos.
A jornalista Marcella Cento-
fanti, de 44 anos, foi alvo dos
criminosos na terça-feira. Ela
recebeu uma ligação telefôni-
ca de um suposto funcionário
do Banco Itaú informando
que sua conta havia sido inva-
dida por criminosos e, por me-
dida de segurança, bloqueada.
Marcella acreditou que o
contato era verdadeiro por
causa das informações cita-
das. “Ele citou o que saiu e o
que entrou na minha conta
nos últimos dias, inclusive
transações via Pix, com no-
mes e valores, além de débitos
automáticos precisos até nos
centavos”, conta a moradora
de Ilhabela, litoral paulista.
Com a orientação do bandi-
do, Marcella criou uma nova
senha pelo aplicativo do ban-
co. O atendimento foi articula-
do e atencioso, sem que o in-
terlocutor pedisse os dados
pessoais. Pelo contrário, orien-
tou que ela não clicasse em ne-
nhum link nem compartilhas-
se sua senha. Até a música de
espera era a mesma usada pelo
banco. Desconfiada, ela acio-
nou a gerente de sua agência e
seu namorado.
O golpe entrou na fase final
quando o criminoso informou
que a conta de Marcella havia
sido acessada por dois apare-
lhos iPhone, de Santo André,
no ABC paulista, com três de-
pósitos entre R$ 9 mil e R$ 10
mil cada. Ele citou os nomes e
os bancos dos endereçados. Já
desesperada, Marcela negou
as operações. O criminoso pe-
diu que ela refizesse as transfe-
rências, com os mesmos valo-
res, para as mesmas contas. Se-
gundo ele, o banco reconhece-
ria a duplicidade e cancelaria a
operação. Marcella teve certe-
za que era um golpe.
Depois que ela desligou,
houve nova tentativa de frau-
de. Uma mulher, usando o no-
me e sobrenome da gerente de
sua agência, disse que estava
ligando a pedido do departa-
mento de segurança do banco.
“Ainda estou abalada. A gente
perde a confiança. Consulto
minha conta a todo momento
para conferir se está tudo
bem. Vou pessoalmente na
agência e pretendo registrar
um boletim de ocorrência.”
Marcella diz que recebeu
uma mensagem em que o Itaú
afirma que “em regra, informa-
ções sobre a conta bancária ou
outras operações são resguar-
dadas pelo sigilo bancário e
apenas podem ser prestadas
ao respectivo titular (ou ao seu
representante legal/procurador
com poderes específicos ou tercei-
ro mediante autorização expres-
sa)”. Em outro trecho, a insti-
tuição informa que “acionou
os órgãos competentes para
análise e avaliação”.
APLICATIVO. Gladis Maria de
Barcellos Almeida, professora
de Linguística e Língua Portu-
guesa da Universidade Fede-
ral de São Carlos (UFSCar), vi-
veu situação semelhante com
o Banco do Brasil no mês pas-
sado. Ela conta que, durante o
golpe, os criminosos pediram
que ela instalasse um aplicati-
vo que supostamente corrigi-
ria as tentativas de fraude em
sua conta. O aplicativo era, na
verdade, o acesso remoto ao
seu celular. “Felizmente, eu
percebi que aquilo estava erra-
do e desliguei o celular. Esca-
pei por pouco”, conta.
A advogada Vanessa Souza,
de 45 anos, por sua vez, não
conseguiu se safar a tempo.
Diante de um contato exata-
mente com o mesmo modus
operandi – atendimento cor-
tês com a descrição dos últi-
mos movimentos do extrato
bancário –, a correntista do
Itaú fez duas operações de
Transferência Eletrônica Dis-
ponível (TED) que totaliza-
ram R$ 20 mil.
O episódio ocorreu em agos-
to do ano passado, mas ela ain-
da aguarda o ressarcimento
bancário. “Ele (o criminoso)
leu meu extrato. Eu senti hu-
milhada, pois fui passada para
trás”, diz.
OUTROS CASOS. O relato de
Marcella viralizou nas redes
sociais. Até a tarde de ontem
foram mais de 1,8 mil comentá-
rios e 26 mil curtidas, muitos
deles de pessoas que viveram
situações parecidas.
“Aconteceu igual comigo,
pelo Santander. Ele me ligou,
tinha acesso a tudo da minha
conta, sabia até o valor do meu
salário. O telefone era o mes-
mo da agência da minha cida-
de. No fim, ele tentou me dar
um golpe de R$ 215 mil. Minha
sorte era que eu tinha R$ 100
na conta”, relatou o designer
gráfico Ivan Soratto.
Desde que o Pix, solução de
pagamento instantâneo do
Banco Central, foi implemen-
tado em novembro de 2020,
ele passou a facilitar uma série
de transferências bancárias
no País. Por outro lado, a nova
ferramenta provocou o au-
mento das ações criminosas.
A maioria “esmagadora”
das invasões a contas bancá-
rias são por meio de phishing,
técnica de engenharia que con-
siste no envio de armadilhas –
normalmente mensagens
com links maliciosos – aos al-
vos. Isso é o que diz o delega-
do Luiz Alberto Guerra, titu-
lar da 2.ª Delegacia de Investi-
gações Gerais (DIG) do Depar-
tamento Estadual de Investi-
gações Criminais (Deic) da Po-
lícia Civil.
O phishing, segundo ele,
normalmente é uma estraté-
gia adotada antes de as quadri-
lhas entrarem em contato
com as vítimas em potencial
para tentar executar o golpe.
“Pode ser um link enviado por
e-mail ou mesmo um SMS,
que vai redirecionar a pessoa
para uma página falsa do ban-
co onde são captados de agên-
cia, conta e senha pelos crimi-
nosos”, afirma o delegado.
Outras formas de se obter
os dados das vítimas são por
meio de ligações telefônicas –
em que criminosos normal-
mente se passam por funcio-
nários de banco e solicitam se-
nhas. l
Golpe do Pix tem nova modalidade
com uso de informações sigilosas
Bancos investem em TI e alertam para fraudes
“Ele citou o que saiu e o
que entrou na minha
conta nos últimos dias,
inclusive transações via
Pix, com nomes e
valores, além de débitos
automáticos precisos
até nos centavos”
Marcella Centofanti
jornalista
Clientes denunciam
que criminosos fazem
abordagens utilizando
dados protegidos,
como movimentações
do extrato bancário
Crime
A Federação Brasileira de Ban-
cos (Febraban) afirma que os
bancos “investem constante-
mente e de maneira massiva
em campanhas e ações de cons-
cientização em seus canais de
comunicação com os clientes
para orientar a população a se
prevenir de fraudes. Além de
campanhas, os bancos inves-
tem cerca de R$ 3 bilhões por
ano em sistemas de tecnologia
da informação para seguran-
ça”. O Itaú Unibanco afirma
que “reforça as orientações pa-
ra que os clientes se atentem a
tentativas de golpes envolven-
do abordagens de falsas cen-
trais de segurança ou falsos
funcionários da instituição”.
Neste sentido, “esclarece que
ligações recebidas pelos clien-
tes solicitando qualquer docu-
mento, senhas, dados cadas-
trais e financeiros, estornos ou
transferências não são práti-
cas da instituição”. Já o Banco
do Brasil informa que os ban-
cos podem ligar para o cliente,
“mas nunca o orientarão a rea-
lizar qualquer procedimento”
nem pedem digitação de se-
nhas. E o Banco Central ressal-
ta que operações do Pix são ras-
treáveis, o que permite identifi-
car contas recebedoras. l
QUINTA-FEIRA, 9 DE FEVEREIRO DE 2023 METRÓPOLE A15 O ESTADO DE S. PAULO
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