O Bom Dia Brasil teve acesso, com exclusividade, a um estudo que o Instituto Sou da Paz fez sobre a origem das armas no país e como elas vão parar nas mãos dos bandidos. Um dos dados dessa pesquisa que chamou atenção é que a arma mais usada nos roubos, a que mais mata o brasileiro, é o revólver 38.
Esse resultado é muito preocupante. As armas usadas nos crimes comuns das grandes cidades são nacionais, que migram do mercado legal para o ilegal. O levantamento incluiu 49.248 armas apreendidas em quatro estados: São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Minas Gerais.
A base das informações foram os boletins de ocorrência. As armas de calibres curtos são as mais apreendidas, 77%. O principal é o revólver calibre 38, com quase 30% e esta é a arma mais usada pelas empresas de segurança no país. Vamos ver como é o caminho destas armas e como elas chegam às mãos do crime.
“Foi aquela gritaria, já deu o disparo, ‘perdeu perdeu’, aquela gritaria toda, levaram celular, dois coletes, dois revólveres e a ‘12’. Chegou esse indivíduo, que era um bandido, e me levou para a porta giratória; ‘libera, libera, ou eu mato ele agora’. A gente se torna uma presa fácil. Vamos pegar o vigilante, ele não tem 15 dias de curso. Hoje, pela lei, são 20 dias de curso, então você não tem aquele preparo”, diz o vigilante Edson José da Silva.
“Não há preparo, não há treinamento que se possa fazer e não é justo que se peça isso da segurança privada para coibir o crime mais sofisticado, o crime do assalto a banco ou mesmo do carro-forte, ele não está preparado para isso, até porque, com um revolver na cintura, ele nunca vai conseguir impedir ou parar a ação de criminosos mais organizados, com armas com alto poder de destruição”, disse o diretor executivo do Instituto Sou da Paz, Ivan Marques.
A notícia do roubo das armas virou o principal assunto na vizinhança. A empresa vinha funcionando de forma precária por causa de dificuldades financeiras. Para entrar na sala de armas os ladrões praticamente arrancaram uma porta-cofre da parede. Ela foi arrombada. Lá dentro ficavam todas as armas, cada uma em um caixilho de uma prateleira. Os ladrões escolheram. Levaram 507 revolveres, duas espingardas e uma pistola.
“É um absurdo, porque essas armas estão ali prontas para serem desviadas, ou no mínimo não estão sendo guardadas de maneira eficiente o suficiente para evitar que estas armas acabem abastecendo a criminalidade”, afirma Ivan Marques.
Assim que os criminosos entraram, eles já renderam os dois seguranças, que foram amarrados e trancados em uma sala. Eles fugiram pela porta da frente levando 60 armas: 20 espingardas calibre 12 e 40 revólveres calibre 38 que estavam guardados em um armário.
“O problema sério que nós temos é o desvio e perda de armas em enormes quantidades. Quem mais fornece armas para o crime hoje, como elemento isolado, é justamente a empresa de segurança privada. Deveria estar oferecendo segurança e está oferecendo insegurança, fornece mais armas para o crime do que o Paraguai e a Bolivia juntos”, afirma o consultor de segurança José Vicente.
“Essas são armas que nós chamamos aqui de armas de uso permitido, são calibres permitidos. Nós temos aqui um revolver 38, que é uma arma muito padronizada para as empresas de segurança privada, não mais para as polícias. Esse é um revólver que tem mais de três anos de uso, tem mais de 50 mil tiros. Esse aqui é a mesma arma, é um revólver também. Ele é calibre 38, também da mesma marca, só que essa arma tem mais de 50 anos. Isso é para mostrar que um revólver ou um armamento, ele não é produto perecível, é equipamento de longevidade”, relata o especialista em segurança Diógenes Lucca, enquanto apresenta as armas.
“O criminoso elege o revólver calibre 38 de fabricação nacional como o perfil da arma usado prioritariamente nos crimes. O que a gente pode dizer é que o que mata o brasileiro hoje e o que acaba sendo usado para auxiliar o roubo do brasileiro hoje é um revólver de calibre 38 de fabricação nacional”, diz o diretor-executivo do Instituto Sou da Paz, Ivan Marques.
Foi um 38 de fabricação nacional que tirou a vida do analista de sistemas Renato da Silva Medeiros, de 31 anos, em janeiro, em um bairro da Zona Leste de São Paulo.
“Tava’ eu e meu amigo no carro, a gente estava ajeitando as pranchas e o Renato estava no portão. Estavam dois armados e desceram três do carro. Teoricamente, eles iam levar o carro, o celular, dinheiro, as pranchas e a gente ia na delegacia fazer um boletim de ocorrência e mais um dia normal em São Paulo. Seria isso e acabou acontecendo essa tragédia”, relata um amigo de Renato.
“Essa migração de uma arma que nasce legal e acaba no mercado ilegal é o que precisa ser olhado com mais atenção pelas nossas forças de segurança para coibir este tipo de situação, para impedir que estas armas cheguem às mãos dos criminosos”, afirma Ivan Marques.
“Nunca imaginei que eu ia perder o meu filho com 31 anos. De repente eu saio, escuto um tiro, levanto, vou lá fora, está meu filho deitado. Até agora eu começo a pensar e a minha vida parece que não tem mais sentido. A minha luz que tinha dentro de mim apagou”, diz Alcileide Medeiros, mãe de Renato.
O Sindicato das Empresas de Segurança Privada disse que combate a clandestinidade e que todos os vigilantes são treinados por instrutores credenciados pela Polícia Federal.
A Polícia Federal, responsável pela fiscalização, informou que no ano passado aplicou 2,9 mil multas e cancelou os registros de cem empresas e que não há, no sistema, uma ferramenta capaz de medir quantas armas são roubadas das empresas.
Na reportagem de quinta-feira (22) o Bom Dia Brasil vai mostrar que, mesmo depois de apreendidas pela polícia, as armas voltam para o crime.
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