BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Uma ala do Palácio do Planalto defende que a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) do ministro Ricardo Lewandowski (Justiça) seja enviada ao Congresso antes das eleições municipais, em outubro.
A PEC propõe, entre outras coisas, dar ao governo federal o poder de estabelecer diretrizes de segurança pública e sistema penitenciário e obrigar os estados a segui-las.
Um auxiliar do presidente Lula (PT) diz acreditar que é possível entregá-la em agosto, na volta do recesso parlamentar. A avaliação é de que a proposta pode ser a resposta do governo e um argumento para os candidatos aliados em questões relacionadas a segurança pública, considerado o tema das eleições deste ano.
O bolsonarismo usa o assunto como uma de suas principais bandeiras, e para integrantes do governo é preciso apresentar propostas para contrapor o discurso da direita.
O texto, elaborado por alguns dos principais assessores do gabinete de Lewandowski, chegou ao Palácio do Planalto no final de junho. Desde então é discutido por uma equipe mais técnica, no âmbito jurídico e no mérito, na Casa Civil.
A ideia inicial era que o próprio Lewandowski apresentasse a proposta a Lula, o que não ocorreu. Segundo aliados, ele falou sobre o tema com o presidente, mas sem muito detalhamento. O texto seguiu direto para a Casa Civil de Rui Costa.
Mais recentemente, foi tópico de conversa entre Costa e o presidente. A orientação que saiu do encontro foi a de buscar uma reunião com os ministros que foram governadores e estão no governo para discutir a proposta. A expectativa era de que a reunião acontecesse nesta semana, mas não teria sido possível por dificuldades de agenda.
O próprio Lula disse querer conversar com ex e atuais governadores sobre o tema.
"Não vou fazer junto com Lewandowski aqui, Casa Civil, AGU um projeto de segurança", disse Lula no último dia 16. "Vou chamar os 27 governadores de estado para dizer o seguinte: governo federal quer participar de segurança pública, qual nosso papel, onde a gente entra, como a gente pode ajudar."
A fala de Lula ocorreu durante reunião para anúncios referentes ao setor da indústria de alimentos, no Palácio do Planalto. "Segurança é mais estadual que federal. Queremos construir uma coisa neste país para dar um pouco de tranquilidade", completou.
A PEC também propõe transformar a PRF (Polícia Rodoviária Federal) em Polícia Ostensiva Federal e ampliar os poderes da PF (Polícia Federal) com a atribuição constitucional de investigar organizações criminosas e milícias privadas quando houver repercussão interestadual e internacional.
Um ministro disse, reservadamente, que a PEC tem seu mérito e é de importante discussão, mas criticou o fato de a proposta não ter sido discutida ainda com governadores.
Em defesa do projeto, um assessor de Lula afirmou que seu texto final ainda não está pronto e que os governadores serão chamados no momento oportuno. Apesar do que disse Lula, ainda não está claro como será esta etapa se apenas aliados ou se representantes de todos os estados serão convidados.
A estratégia de chamar as partes interessadas para conversar antes de enviar o texto é justamente diminuir divergências e eventuais desgastes. E também está precificado que a PEC passará por ajustes no Planalto e no Congresso.
Governadores ouvidos pela Folha de S.Paulo se queixaram de que o governo não os procurou para discutir o texto. Isso gerou incômodo, já que a segurança pública afeta diretamente estados e municípios, além de ser o segundo maior motivo de preocupação entre os brasileiros, de acordo com uma pesquisa do Datafolha.
"No meu entendimento, é preciso haver um debate com os governadores", afirmou o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB).
O governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB), diz acreditar que, se a PEC garantir uma maior integração, será benéfica. Ele diz não concordar, no entanto, com a imposição das diretrizes pelo governo federal aos estados.
"Eu acho que precisa ser discutido e que o governo não vai fazer nada sem discutir conosco. Eu acredito que o que deve acontecer é aumentar a participação do governo na articulação, mas acredito que a interferência não vai acontecer", afirmou.
Já o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União), criticou a proposta, chamando-a de "desconectada da realidade".
"O governo federal tem a iniciativa de coibir crimes que são de sua alçada: lavagem de dinheiro, narcotráfico, comércio de armas, tudo isso. E para você preparar isso tudo, ao invés de querer interferir dizendo o que cada estado tem que fazer, devia se preocupar em fazer acordos internacionais com os países que são limítrofes", defendeu.
Renato Sérgio de Lima, diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, afirmou que a PEC deve garantir à União o papel de coordenação.
No SUS (Sistema Único de Saúde), modelo que quer seguido pela pasta, as políticas são definidas por Ministério da Saúde, Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde) e Conasems (Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde).
"No SUS, a União tem um papel coordenador e é responsável pela publicação das portarias com as diretrizes. A política, entretanto, é discutida e aprovada por um conselho composto pela União, estados e municípios. Impor as diretrizes sem diálogo e pactuação técnica prévia, não há chance da PEC avançar", disse Lima.
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