O ideal, na realidade, é que esses adolescentes não ingressem no sistema socioeducativo
João Veríssimo Fernandes é presidente da Fundação CASA e ex-juiz de Direito
A Lei 12.594/2012 criou há 11 anos o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), um marco jurídico que regulamentou, de forma complementar ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a execução das medidas socioeducativas para os adolescentes que cometeram ato infracional. O regramento foi promulgado em 18 de janeiro de 2012.
O primeiro passo importante da lei foi ressaltar ser o atendimento socioeducativo um sistema, formado pelos elaboradores da política pública em todos os níveis – União, Estados, municípios e Distrito Federal –, o Poder Judiciário, o Ministério Público e a Defensoria Pública, cada qual com suas atribuições e responsabilidades.
A lei, contudo, teve um embrião, a Resolução nº 119/2006 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), documento este que, em São Paulo, foi o norteador da mudança institucional da Fundação CASA, junto à Constituição Federal e ao ECA, passando a se basear no respeito aos direitos humanos das pessoas com idade entre 12 anos e 21 anos incompletos que cometeram ato infracional.
Esses anos de vigência da lei impactaram, direta ou indiretamente, o perfil dos adolescentes atendidos. Na época da promulgação do Sinase, a Fundação CASA estava com 31.813 adolescentes anualmente atendidos, chegando ao pico de 33.798 em 2013.
Hoje é possível observar algumas mudanças. É inegável a queda no atendimento desde o pico: o ano de 2022 registrou 15.188 adolescentes atendidos, ou seja, 55% a menos do que em 2013.
A redução também levou a Fundação CASA a suspender o funcionamento de 31 centros socioeducativos no Estado entre 2019 e o ano passado. Atualmente, são 116 centros socioeducativos ativos em 46 cidades. Apesar da redução, São Paulo ainda tem o maior sistema de execução do país.
Pardos e pretos continuam sendo a maioria, com 71,75%, um aumento de mais de quatro pontos percentuais, enquanto o número de brancos reduziu para 27,75%. Isso pode ser um sinal tanto da mudança da consciência sobre a autodeclaração da cor como também um reflexo do racismo estrutural do nosso país.
O tráfico de drogas ainda continua recrutando a nossa juventude, sendo responsável por 40,98% do atos infracionais, seguido do roubo qualificado, com 36,06%. Porém, entre os anos de 2013 e 2016 o roubo qualificado, que é um ato cometido mediante violência e grave ameaça, superou o tráfico de drogas.
Talvez a maior modificação tenha ocorrido no perfil educacional. Em 2022, 42,13% dos adolescentes atendidos estavam cursando o Ensino Médio, um aumento de 27 pontos percentuais em relação a 2012, o que retrata que, pelo perfil da idade do atendimento, eles estavam, em geral, na idade-série correta. Tanto que o número de jovens no Ciclo I do Ensino Fundamental caiu para 3,25% em 2022, uma queda de 12 pontos percentuais. O total de adolescentes no Ciclo II do Ensino Fundamental caiu para 49,56%.
O ideal, na realidade, é que esses adolescentes não ingressem no sistema socioeducativo nem que venhamos a discutir os novos impactos da lei do Sinase. Um dos caminhos é a garantia da proteção integral, como prevê o mandamento constitucional, com prioridade absoluta e compromisso da família, da sociedade e do Estado.
João Veríssimo Fernandes, Presidente da Fundação CASA e ex-juiz de Direito
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