Com cerca de 130 mil adolescentes e jovens em cumprimento de medidas socioeducativas, o sistema socioeducativo do país ainda enfrenta dificuldades na oferta de oportunidades de aprendizagem e profissionalização para esse público. Uma recomendação conjunta entre o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Conselho Nacional do Ministério Público (CMNP) aprovada ontem pode ajudar a modificar esse cenário. O Ato Normativo 0004645-58.2024.2.00.0000 orienta os tribunais e o Ministério Público a adotarem ações articuladas para o fortalecimento, apoio e estímulo a ações de aprendizagem e qualificação profissional de adolescentes, incluindo jovens durante ou após o cumprimento de medidas socioeducativas, seja em meio aberto ou fechado. Apesar da recomendação abarcar jovens de até 21 anos, a recomendação prioriza a faixa etária dos 14 aos 18 anos, considerando o princípio constitucional da prioridade absoluta e o fato de que esse público tem frequentemente menos acesso às ações de profissionalização.
De acordo com o Painel BI do Censo Nacional de Práticas de Leitura no Sistema Socioeducativo, publicado pelo CNJ em 2023, no ano de 2022 havia o total de 11.933 adolescentes no meio fechado no Brasil. Destes, 99% estavam na faixa etária de 14 a 21 anos e podem ser impactados com a Recomendação. O levantamento do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase) de 2023, realizado pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), mostra ainda que cerca de 66% dos adolescentes em meio fechado participaram de atividades de profissionalização no ano passado. Não há dados dessa natureza relativos a jovens em cumprimento de medidas em meio aberto nem em situação de pós- cumprimento.
O texto estimula que os órgãos do Poder Judiciário e do Ministério Público (estaduais e da União) criem programas próprios ou estabeleçam convênios voltados à formação técnico-profissional desses e dessas adolescentes. Incentiva, ainda, a promoção de parcerias interinstitucionais com Superintendências Regionais do Trabalho, Defensorias Públicas, Tribunais e Ministério Público de Contas e entidades do “Sistema S”.
“Tanto o CNJ como o CNMP já possuíam normativas que tratavam do tema, mas a Recomendação Conjunta tem o diferencial de alinhar os esforços em iniciativas, potencializando a pauta e tornado tribunais e ministérios públicos como indutores dessa ação”, defende o juiz auxiliar da Presidência do CNJ e coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF/CNJ), Luís Lanfredi. “A sociedade justa e inclusiva para todas e todos começa pela qualificação e pela oferta de novas trajetórias aos nossos jovens, cujos caminhos de vida podem e devem ser redesenhados durante e depois da passagem pelo sistema socioeducativo.”
O juiz auxiliar da presidência do CNJ com atuação no DMF Edinaldo César Santos Junior acredita que a incidência do Poder Judiciário poderá influenciar positivamente os programas de jovens aprendizes, inclusive em relação à diversificação temática. “Os levantamentos que fizemos como Censo Nacional de Práticas de Leitura no Sistema Socioeducativo e a 1.ª Conferência Livre de Cultura no Sistema Socioeducativo apontam o interesse dos e das adolescentes em temas como Tecnologia da Informação, Comunicação, Economia Criativa e Cultura, que não são tão comuns nas experiências de jovens aprendizes”, afirmou. Para o juiz, “um leque amplo de opções de programas de aprendizagem profissional pode auxiliar na construção de projetos de vida de jovens em medidas socioeducativas, com a possibilidade de garantir trabalho e renda”.
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O contrato de aprendizagem, previsto no artigo 431 da CLT, é uma forma de contratação que pode ser destinada a pessoas maiores de 14 anos e que pressupõe ações de formação técnico-profissional. Para o setor privado, a Lei da Aprendizagem (Lei 10.097/2000) determina a contratação nessa modalidade entre 5% e 15% do quadro de funcionários para empresas de pequeno e médio porte. Esse jovem tem a carteira de trabalho assinada e o direito a receber salário-mínimo, 13.º salário, FGTS, férias e vale-transporte. Dados do Executivo mostram que o país possui mais de 600 mil contratos ativos de jovens aprendizes em diferentes áreas e instituições, mas não há detalhamentos sobre o percentual de participação de jovens em cumprimento de medidas socioeducativas nessas estatísticas.
O Programa Fazendo Justiça, iniciativa coordenada pelo DMF/CNJ em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), fomenta ações desde a porta de entrada até a porta de saída do sistema socioeducativo, incluindo iniciativas de aprendizagem, acesso à cultura e formação. Uma das frentes de atuação do Fazendo Justiça é voltada ao impulsionamento e à ampliação da oferta de oportunidades de aprendizagem e qualificação profissional para adolescentes e jovens em cumprimento e pós-cumprimento de medidas socioeducativas, sob a perspectiva da promoção do acesso a direitos e do fortalecimento do protagonismo desses(as) adolescentes e jovens. Nesse sentido, o programa vem apoiando a mobilização de órgãos gestores do sistema socioeducativo e entidades parceiras voltadas ao ensino e à aprendizagem desse público para pactuação de ações conjuntas, por meio de ações coordenadas por tribunais de justiça nos estados.
Saiba mais sobre as ações do Fazendo Justiça voltadas ao Sistema Socioeducativo
Texto: Pedro Malavolta
Edição: Nataly Costa
Agência CNJ de Notícias
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