29 de agosto de 2024, 14h45
No Brasil, um jovem de 16 anos tem discernimento para saber o que é certo e errado. Logo, ele tem plenas condições de responder criminalmente por um ato ilícito que venha a praticar. Seguindo essa lógica, a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos é medida que se impõe como forma de diminuição da criminalidade no país.
Quem diz isso é o secretário de Justiça da cidade de São Paulo, Fernando José da Costa. Ele tratou do assunto em entrevista à série Grandes Temas, Grandes Nomes do Direito. Nela, a revista eletrônica Consultor Jurídico conversa com alguns dos nomes mais importantes do Direito sobre os assuntos mais relevantes da atualidade.
“Em 1940, quando foi criado o nosso Código Penal, nós tínhamos um entendimento sobre a maioridade penal. Nós estamos em 2024 e entendemos que pelo menos os jovens a partir de 16 anos têm discernimento para saber o que é certo e errado. Logo, se eles têm discernimento, eles têm responsabilidade. E se eles têm responsabilidade, eles têm responsabilidade penal. Então nós temos, sim, de reduzir a maioridade penal.”
O secretário reconhece que o assunto é polêmico, mas observa que parte das pessoas que opinam sobre a questão não sabe que ela está muito mais relacionada ao discernimento do agente do que ao tipo de punição que será aplicada a ele. E esse aspecto, segundo Costa, faz toda a diferença no debate.
“Algumas pessoas dizem: ‘Nós temos presídios com superlotação. O topo de pena provavelmente não vai ressocializar o jovem’. A discussão, porém, não está relacionada ao tipo de punição que será dada àquela pessoa. O que é preciso é dar à sociedade uma resposta de que aquela pessoa que pratica um ato ilícito deve responder criminalmente”, disse o secretário, que é doutor em Direito Penal.
Para demonstrar esse ponto de vista, o secretário citou o exemplo dos usuários de drogas, que hoje recebem penas alternativas, em vez da privativa de liberdade. Seguindo esse raciocínio, se a intenção é discutir a adoção de penas restritivas de direitos para menores de 18 anos, eventualmente até com medidas de internação, essa é uma discussão a ser travada em outro momento.
“O que nós não podemos é sustentar hoje que um jovem de 16, 17 anos não tem discernimento para saber o que é certo e errado. ‘Ah, mas há alguns jovens de 17 que não sabem o que é certo e errado’. Há pessoas de 50 que não sabem o que é certo e errado. Essas pessoas o Código Penal protege. Elas são tidas como inimputáveis ou semi-imputáveis.”
Sentimento de justiça
Para Fernando José da Costa, a redução da maioridade atenderia a um anseio da sociedade por um “sentimento de justiça”. Nessa visão, segundo ele, se uma pessoa pratica um latrocínio aos 17 anos de idade e a legislação em vigor estabelece que o autor do crime é inimputável e não vai responder pelos seus atos, isso equivale a não aplicar todos os recursos legais disponíveis a um caso que requer outro tipo de resposta.
“Não tenho a menor dúvida de que a redução da maioridade penal vai diminuir a criminalidade. Não estou dizendo para aplicarmos pena privativa de liberdade. Sobre isso, eu estou aberto a discutir com a sociedade, com o Judiciário, com a Ordem dos Advogados, com a Defensoria, com o Ministério Público, com médicos, sociólogos. É um tema que merece ser discutido: que tipo de punição a pessoa deve receber para que ela, após praticar um ilícito, melhore com a punição. Mas sustentar que essa pessoa não tem amadurecimento é sustentar o insustentável”, disse ele, que dirige o curso de Direito da Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP).
Propostas
No Congresso Nacional, a redução da maioridade penal foi tema de diversos projetos de lei. A Proposta de Emenda à Constituição 115/2015, por exemplo, buscava reduzir a idade de 18 para 16 anos nos casos de crimes hediondos, homicídio doloso e lesão corporal seguida de morte. O texto, porém, foi arquivado em dezembro de 2022, no final da legislatura anterior.
A maioridade penal é cláusula pétrea da Constituição, que estabelece, em seu artigo 60, parágrafo 4º, que os direitos e as garantias individuais não poderão ser objetos de deliberação em proposta de emenda constitucional tendente a abolir ou mitigar seus efeitos. Além disso, o parágrafo 2º do artigo 5º estende a proteção reservada aos direitos e às garantias fundamentais a aqueles que não estão elencados no Título II da Constituição, entre os quais o contido no artigo 228: “São penalmente inimputáveis os menores de 18 anos, sujeitos às normas de legislação especial”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário