Processo trabalhista: suas etapas e como funcionam
O processo trabalhista existe pela insatisfação de uma das partes da relação de emprego (empregado ou empregador) com a outra por algo que ela fez, deixou de fazer ou deixou de cumprir.
Esse conflito é submetido à Justiça do Trabalho, que irá decidir se a insatisfação da parte que move a demanda tem cabimento tanto legal quanto de fato.
A situação mais comum é de empregados processando seus empregadores, mas o contrário também pode acontecer. Por razões didáticas, iremos nos ater no presente post apenas à primeira hipótese (empregado com processo trabalhista contra o empregador).
Etapas do processo trabalhista
Doutor, em quanto tempo vai sair meu processo trabalhista?
Essa é de longe a pergunta mais comum que nós advogados escutamos quando contratados para cuidar dos interesses de alguém em uma demanda na Justiça do Trabalho, para a qual não há resposta porque é impossível dar uma previsão.
Quando perguntam o tempo para “sair o processo” ninguém está preocupado com a decisão de mérito em primeira instância, eventual recurso ordinário, ou fase de liquidação, a pessoa quer saber em quanto tempo o dinheiro estará na mão dela.
Se essa última parte ficou confusa, foi só para ilustrar que as coisas não são tão simples.
Contratação do advogado e “montagem” do processo trabalhista
Na Justiça do Trabalho a parte não precisa necessariamente contratar um advogado, pode entrar sozinha na Justiça, mas as coisas podem ser complicadas sem a experiência de alguém que na prática faz isso comumente.
Vamos supor então que o empregado contratou um advogado. Necessariamente o causídico precisará de vários documentos para fazer prova das alegações do empregado ao juiz que decidirá a causa.
Na maior parte das vezes é de responsabilidade da própria parte conseguir os documentos para instruir (fundamentar) a causa e o que ela persegue, seja férias não pagas, rescisão incorreta, dano moral etc.
Ao advogado cabe traduzir aquilo que a parte está pedindo para o “juridiquês”, descartando tudo o que não for essencial e explicando os motivos e a fundamentação com os documentos que a parte lhe trouxe. Essa explicação é uma peça escrita que recebe o nome de petição inicial, na qual se anexa a documentação pertinente ao caso.
Dependendo da complexidade da matéria, a elaboração da petição inicial e a reunião dos documentos pela parte pode demorar mais ou menos tempo.
Fase de conhecimento
Diz-se “de conhecimento”, pois a matéria começará a ser discutida frente ao Judiciário e dela resultará o título executivo judicial, cujo valor será transformado em dinheiro na próxima fase (de liquidação).
Distribuição e marcação de audiência
Assim que a petição inicial estiver completa, chega a hora de sua distribuição, cujo nome é bem ilustrativo, pois o advogado distribuirá a peça inicial (petição inicial) do processo trabalhista para uma das Varas do Trabalho da região competente para conhecer do conflito.
Em outros termos, há um sistema eletrônico de distribuição que fará um sorteio para alguma das Varas do Trabalho onde a nova demanda cairá; caso exista apenas uma Vara do Trabalho na cidade ou região, não haverá sorteio (por razões óbvias). Com o sorteio também geralmente já é designada a data da primeira audiência pelo sistema eletrônico.
Nessa etapa se iniciam as distorções de tempo entre processos idênticos que foram distribuídos no mesmo dia, mas que caíram em varas diferentes.
Vamos supor que essa foi exatamente a situação: duas colegas contrataram o mesmo advogado, pois foram demitidas no mesmo dia, sem pagamento correto da rescisão porque a empresa estava fechando as portas; as ações foram distribuídas no mesmo dia e hora, mas a primeira audiência de uma delas seria depois de duas semanas após a distribuição e a outra após um ano.
Essa distorção ocorre pois as Varas do Trabalho têm juízes diferentes, passam por certos problemas peculiares que outras não passam etc.; pode haver uma infinidade de fatores para que o serviço em uma esteja atrasado e na outra ocorra com uma precisão britânica.
Audiências
A CLT dispõe que a audiência no processo trabalhista é UNA, em outras palavras, deve ser realizada em uma única ida ao fórum a proposta de conciliação, a instrução e o julgamento.
Contudo, na prática de São Paulo (TRT 2ª Região) pelo menos, há a divisão dessa audiência em duas ou mais, conforme segue:
Audiência inicial (e de conciliação)
Necessária a presença das partes.
Caso o empregado não compareça o processo é arquivado. Porém, caso quem não compareça é o empregador, o processo é julgado à sua revelia, ou seja, toda a matéria fática que a petição inicial trouxe ao conhecimento do juiz é considerada como verdadeira.
Ambos estando presentes, o juiz deve sempre buscar a conciliação, para que as partes entrem em um acordo e deem um fim ao processo pela negociação presencial em audiência.
Chegando em um acordo (conciliação), o processo trabalhista acaba aqui mesmo: combina-se como se dará o pagamento (quantas vezes e o valor).
Sendo que em caso de não pagamento do acordo, estipulam-se multas altas e o vencimento antecipado das parcelas restantes, e o processo irá diretamente para a fase de execução(abaixo).
Por outro lado, caso não haja acordo, o juiz determinará a juntada da contestação da empresa (caso compareça) e a produção das demais provas que se fizerem necessárias e não puderam ser obtidas unicamente com os documentos do empregado (na petição inicial) e do empregador (na contestação).
Audiência de instrução (e de conciliação)
Necessária a presença das partes.
Conforme já salientado, essas duas audiências (inicial e instrução) podem ocorrer num único ato, mas em geral pelo volume de processos crescente da Justiça do Trabalho elas são divididas em duas ou mais.
A audiência de instrução serve ao propósito de produção de prova oral, faz-se a prova que não pôde (seja por impossibilidade ou falta específica de oportunidade) ser produzida documentalmente, sendo concretizada por meio do depoimento de testemunhas e das próprias partes envolvidas.
Audiência de julgamento
Não é necessária a presença das partes.
Esse é um dos últimos atos do juiz da vara no processo na fase de conhecimento, quando ele decide e julga a causa que lhe foi apresentada, levando em consideração todos os elementos dos autos, como petição inicial e documentos, defesa e documentos, laudos periciais, depoimentos das partes e testemunhas entre outros. As provas já foram produzidas e o processo trabalhista está maduro para ser decidido (sentenciado).
O juiz exerce a sua função, podendo desagradar o empregado (ação julgada improcedente), o empregador (ação julgada procedente) ou ambos (ação julgada parcialmente procedente). Alguém geralmente estará insatisfeito com a decisão, seja pelo juiz deferir ou indeferir, no todo ou em parte, aquilo que foi pedido pelo empregado, ou pelo empregador, cabendo à parte que se sentir lesada recorrer.
Recurso para o segundo grau
Na Justiça Trabalhista a apelação recebe o nome de recurso ordinário, tendo 8 dias para recorrer qualquer das partes; quando aceito o recurso, o processo trabalhista “sobe” para o segundo grau.
Enquanto na Vara (primeiro grau) o processo é decidido por um único juiz, no segundo grau três juízes diferentes decidem acerca daquela questão em particular que foi abordada no recurso ordinário do empregado, do empregador ou de ambos. São três juízes (denominados desembargadores) que fazem parte de uma Turma, um deles escreve como vota (escreve o voto da questão), outros dois revisam aquele voto e votam favorável ou contrariamente ao entendimento, sendo que o entendimento da maioria irá prevalecer, por isso se fala em julgamento colegiado.
Nas denominadas Sessões de Julgamento os advogados das partes podem sustentar oralmente (discursar) as razões pelas quais a decisão do juiz de primeira instância (sentença) deve ser reformada ou mantida, sendo que os votos são pronunciados logo depois, ou na próxima Sessão de Julgamento caso da sustentação oral suscitar algum ponto relevante não considerado no voto.
Recurso para o Tribunal Superior do Trabalho
Caso a decisão dos desembargadores em segunda instância contenha interpretação de norma legal divergente entre Tribunais ou entre o Tribunal e o Tribunal Superior do Trabalho, ou contrarie literalmente dispositivo de lei federal ou da Constituição, cabe recurso de revista ao Tribunal Superior do Trabalho (Brasília).
Após, não cabendo mais recursos, dá-se o “trânsito em julgado” do processo trabalhista na fase de conhecimento.
Fase de liquidação e execução
Após a discussão do direito que não precisa necessariamente passar por todas as fases “de conhecimento”, e caso exista algum crédito em favor do empregado, temos a denominada fase de liquidação e execução da decisão judicial, na qual aquilo discutido nas diversas instâncias é transformado em dinheiro.
Fase de liquidação do processo trabalhista
Com o trânsito em julgado – que, repita-se, pode se dar em qualquer das fases de conhecimento – o processo volta ao juiz da Vara sendo aberto prazo para que o empregado ou empregador apresentem cálculos detalhados daquilo que foi determinado nas decisões da fase de conhecimento.
Apresentados os cálculos por uma das partes e não concordando a outra com os valores, poderá apresentar uma impugnação aos cálculos de liquidação, demonstrando os motivos de sua discordância e os cálculos que entende corretos.
Caso as partes não se acertem acerca do valor, o juiz pode optar pelos cálculos que entender corretos (aqueles apresentados pelo empregado ou pelo empregador), ou determina que sejam realizados por um perito contador de sua confiança.
Seja qual dos cálculos o juiz decida por acertados (empregado, empregador ou perito) realiza sua homologação, em outros termos, o valor apresentado nos cálculos homologados passa a ser efetivamente exigível pela parte credora, sendo que, ultrapassada tal fase, inicia-se a execução.
Fase de execução
Após a determinação do valor devido pelo empregador (executado) ao empregado (exequente), o juiz expede mandado para que o executado pague a dívida mediante depósito em dinheiro ou ofereça bens à penhora no prazo de 48 horas; tais bens ficam subordinados à Justiça para eventual alienação. Caso o bem desapareça ou seja destruído, o responsável pode responder como depositário infiel.
Efetuado o depósito ou a penhora, as partes têm 5 dias para impugnar o valor que foi homologado pelo juiz.
O exequente pode apresentar uma petição denominada impugnação à sentença de liquidação, no qual deve indicar o porquê os cálculos homologados estão incorretos; a mesma prerrogativa é dada ao executado, contudo, apenas mediante depósito ou penhora, denominando-se tal como embargos à execução.
Recurso para o segundo grau em execução
Deve o juiz decidir qualquer desses recursos na fase de execução.
Desta decisão é possível ingressar (qualquer das partes) com um novo recurso no prazo de 8 dias à segunda instância (Tribunal Regional do Trabalho) denominado agravo de petição. Tal recurso também será julgado por 3 desembargadores.
Importante destacar que na fase de execução só são aceitos recursos aos Tribunais Superiores em casos de violação à Constituição Federal.
Pagamento
Também há o denominado trânsito em julgado na fase de execução; assim, quando não houver recursos após a homologação dos cálculos, ou todos os recursos já tiverem sido decididos sem que haja pendência de julgamento, o depósito judicial pode ser liberado ao exequente ou o bem penhorado é levado a leilão para ser convertido em dinheiro.
Essas duas possibilidades (liberação do dinheiro e leilão) não são imediatas.
Para que a parte ou o advogado possam levantar o dinheiro depositado no processo, a Vara precisa expedir o denominado alvará de levantamento, que é uma determinação da Justiça do Trabalho ao banco de que o dinheiro pode ser levantado por quem consta do alvará, o que nem sempre é um processo rápido, pois a Vara pode demorar na confecção do documento e o banco pode (como raramente ocorre) estar em greve.
Já o leilão do bem penhorado pode ser um calvário ainda maior, em razão de ser necessário aguardar a existência de diversos bens correspondentes a centenas de outros processos para que o leilão seja realizado, em geral, num único dia. Sendo que só após a efetiva venda do bem o valor poderá ser liberado ao exequente.
Ausência de bens – executado insolvente
Todo esse procedimento (acredite se quiser!) é como seria o processo trabalhista em um mundo ideal.
Contudo, situação das mais comuns e que toma muita energia das Varas do Trabalho é aquela em que não há nem dinheiro nem bens para pagar o exequente. Passa-se por todo o procedimento e o processo “não sai” no final, o famoso “ganhou, mas não levou”.
Em outros termos: a parte tem o direito reconhecido, mas o valor que lhe é devido não foi encontrado ou não existe para satisfazer esse direito.
O processo trabalhista busca sempre a maior efetividade possível, ou seja, esse direito reconhecido lá atrás na fase de conhecimento deve ser transformado em valor que pode ser auferido e aproveitado na vida real, afinal de contas, de nada adianta não receber aquilo que é reconhecidamente devido em título judicial.
Por tal razão há mecanismos como penhora de contas judiciais de empresas, verificação se possuem bens móveis e imóveis (DETRAN e ARISP em São Paulo), busca no patrimônio dos sócios caso haja suspeita de fraude ou ocultação dolosa do patrimônio etc.
Se mesmo assim não forem encontrados bens ou valores, o processo trabalhista segue para o arquivo provisório e de tempos em tempos há novas verificações de possíveis bens em nome das empresas e seus sócios.
Glossário de andamentos – o que significa
Provavelmente este post de como funciona o processo trabalhista não tenha respondido a dúvida lá do começo: “quando ele sai?”, quando a pessoa receberá o dinheiro?
Como já dito, não há como precisar o tempo, mas tomando-se por base o andamento processual, há como saber em que fase se encontra o processo.
Cada Estado possui o seu Tribunal Regional do Trabalho, com exceção de São Paulo, que possui dois (2ª e 15ª Região).
Geralmente no site de cada um dos Tribunais há uma seção dedicada aos andamentos processuais, sendo que cada processo é identificado por um número único como, por exemplo, 0004321-99.2020.5.02.0123, onde:
- 0004321 – significa o número do processo;
- 99 – dígito verificador;
- 2020 – ano do ajuizamento (distribuição);
- 5 – pertence à Justiça do Trabalho;
- 02 – qual das Regiões (no exemplo é a 2ª Região); e
- 0123 – código da vara em que se encontra.
Cada um dos processos possui seu próprio andamento, como nossa atuação mais comum se dá no TRT da 2ª Região, faremos o glossário baseado nos andamentos processuais mais comuns desse Tribunal.
- Distribuído com marcação de audiência: como explicado acima, nada mais é que o sorteio para uma das varas do trabalho após a petição inicial estar finalizada;
- Expedição de Intimação/Citação para audiência: o aviso ao empregador/empregado de que há um processo em face dele já foi expedido pela Vara, informando sobre a data e local em que a audiência será realizada;
- Concluso (ao juiz): pode ser literalmente qualquer coisa, algo que precise ser decidido pelo juiz para que o processo possa ter seu andamento normal retomado;
- Aguardando Redação Sentença Audiência de Julgamento: após as audiências que exigem a presença das partes e em não sendo conciliadas (acordo), o juiz deve sentenciar (decidir) a causa em audiência de julgamento;
- Improcedência, procedência ou procedência em parte de Ação: resultado dos pedidos em sentença;
- Remessa para 2ª Instância: seja pelo recurso ordinário (fase de conhecimento), ou pelo agravo de petição (fase de execução), os autos são remetidos da Vara ao Tribunal para decisão do recurso;
- Recebimento do TRT: após a decisão da 2ª instância ou do Tribunal Superior do Trabalho, o processo retorna à vara de origem;
- Protocolo de petição (várias): o processo trabalhista é composto de inúmeros atos individuais das partes, do juiz e dos assistentes do juiz. Cada um desses atos das partes é realizado por meio de petições, um recurso ordinário é uma petição, apresentação de cálculos é feito por meio de petição também… enfim, todos os atos são realizados e registrados por meio de petições que são peças (escritos) solicitando alguma providência, obedecendo alguma ordem judicial ou recorrendo de decisões;
- Despacho: os atos do juiz dentro do processo que não são sentenças, podem ser considerados despachos que não necessariamente decidem a questão final objeto do processo trabalhista, mas determinam alguma providência para o seu andamento;
- Publicação de Notificação Ciência Despacho: aviso por meio do Diário Oficial, para uma das partes ou para todas, acerca do despacho do juiz;
- Publicação de intimação: aviso por meio do Diário Oficial, para uma das partes ou para todas, de que alguma providência precisa ser tomada;
- Entrega em carga/vista: alguma parte ou interessado retirou os autos da Vara;
- Recebimento de autos: o processo foi devolvido para a Vara;
- Decurso de prazo para (várias): decorreu o prazo para que a parte interessada realizasse alguma providência teoricamente de seu interesse;
- Expedição de Mandado Citação Penhora Avaliação: após homologados os cálculos a parte é citada para pagamento;
- Trânsito em Julgado: não cabe mais recurso;
Há diversos outros andamentos, mas esses são os que aparecem com maior frequência.
Conclusão
Depois de explicados e abordados diversos temas e o procedimento mais ou menos comum que os processos individuais do trabalho seguem, ainda não chegamos nem perto de explicar todas as possibilidades do procedimento.
Porém essa jamais foi nossa intenção, mas sim mostrar a complexidade do processo trabalhista e o porque ele muitas vezes “não sai” mais rápido
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