Para evitar contaminação em massa do novo coronavírus no sistema prisional e socioeducativo, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) vem apoiando o Judiciário a responder a novos desafios em um cenário historicamente marcado por superlotação e insalubridade, já reconhecido como ‘estado de coisas inconstitucional’ pelo Supremo Tribunal Federal. As ações são guiadas pela Recomendação 62/2020, aprovada pelo plenário do CNJ em 17 de março e reconhecida pela comunidade internacional ao incentivar medidas práticas para proteger tanto os profissionais que atuam na área quanto as pessoas privadas de liberdade.
Responsável por coordenar esse trabalho, o Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF/CNJ) trabalha com o apoio do programa Justiça Presente. A parceria foi iniciada em janeiro de 2019 entre o CNJ e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), com apoio do Ministério da Justiça e Segurança Pública, para enfrentar problemas estruturais do sistema prisional e do sistema socioeducativo. No entanto, devido ao contexto da pandemia diversas ações foram adaptadas para melhor atender às necessidades práticas do novo cenário.
Como explica o coordenador do DMF/CNJ, Luís Geraldo Lanfredi, somente ações técnicas embasadas em evidências poderão levar o Poder Público a dar respostas precisas ao tamanho do desafio. “Além de disseminar a importância de se investir em práticas de saúde e higiene para toda a população, o Judiciário precisa garantir que as penas serão cumpridas na medida da sentença. A possibilidade de infecções em massa dentro das unidades de privação de liberdade, situação que estamos observado com preocupação nas últimas semanas, viola essa mesma premissa. Não há responsabilização possível quando o Estado não provê condições mínimas para o apenado ou do adolescente em cumprimento de medida socioeducativa”, diz.
Porta de entrada e tecnologia
Por meio dos coordenadores estaduais do Justiça Presente, o CNJ vem atuando em todas as unidades da federação para apoiar o poder público local na adoção de medidas necessárias a partir das propostas da Recomendação 62/2020, como a criação de comitês de acompanhamento com ampla participação do poder público e da sociedade civil, assim como o trabalho para facilitar a criação e implementação de planos de contingência.
Em relação à porta de entrada, mesmo com a suspensão temporária das audiências de custódia, os consultores do Justiça Presente prestam apoio técnico a magistrados para oferecer mais elementos para análise dos autos de prisão em flagrante encaminhados pelas polícias. Além disso, foram sugeridos fluxos para garantir a saúde do custodiado e proteção contra possíveis atos de tortura ou maus tratos e fluxos de proteção social. As ações em audiência de custódia têm apoio técnico do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC). Também foram emitidas orientações técnicas sobre uso de monitoração eletrônica, alternativas penais e suplementação de convênios.
No campo da tecnologia, foram criados dois novos filtros no Sistema Eletrônico de Execução Unificado (SEEU) sobre grupos de risco para geração de relatórios que podem auxiliar na análise dos processos durante a pandemia. Outra novidade é a consulta de qualquer classe processual, permitindo a busca de todos os processos cadastrados no sistema. O objetivo é garantir a autonomia dos Tribunais que já utilizam o SEEU em uma melhor análise dos casos, por meio de relatórios detalhados.
Também está em desenvolvimento a autenticação em dois fatores, para que magistrados possam assinar as peças em análise de forma mais ágil –e ainda segura– durante o teletrabalho. As forças-tarefa que atuavam na implantação do SEEU tiveram que ser interrompidas durante a pandemia, mas o trabalho continua de forma remota nos Tribunais de Justiça do Amazonas, Mato Grosso do Sul e Rio de Janeiro. Estes tribunais continuam recebendo auxílio no desenvolvimento de tecnologias para a migração de dados para o SEEU e na integração de plataformas.
Cidadania e socioeducativo
Em relação aos Escritórios Sociais, estruturas de atendimento à população egressa promovidas pelo CNJ desde 2016, o CNJ tem buscado interlocução com parceiros locais para manutenção dos atendimentos, em consonância com portaria do Ministério da Cidadania. Junto aos Tribunais de Justiça e aos órgãos gestores da administração penitenciária, o CNJ busca acompanhar os casos de soltura decorrentes da Recomendação CNJ n. 62/2020, para que sejam encaminhados aos Escritórios Sociais.
O CNJ também dialoga com o Judiciário acerca da concessão de remição para pessoas privadas de liberdade que tiveram suas atividades laborais e educacionais suspensas, uma vez que a suspensão das atividades decorre de motivo de força maior. Trabalha, ainda, para evitar situações de violação e descumprimento de orientações sanitárias nos sistemas prisional e socioeducativo, com especial atenção para os ambientes de isolamento das unidades de privação de liberdade.
Em relação ao sistema socioeducativo, foi expedida nota sobre audiências de apresentação em complemento à Recomendação 62, orientando para que as audiências de adolescentes privados provisoriamente de liberdade continuem a ser realizadas presencialmente quando viável.
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