quinta-feira, 2 de outubro de 2025

Reforma administrativa: PEC limita supersalário, veda férias de 60 dias e cria regras para concursos

 


Proposta será protocolada por deputado Pedro Paulo (PSD-RJ) na Câmara; saiba o que tem nos textos, obtidos pelo Estadão com exclusividade

Por Daniel Weterman
Atualização: 

BRASÍLIA — A reforma administrativa na Câmara vai propor uma tabela única de remuneração para todo o serviço público brasileiro, instituir uma medida de avaliação do desempenho dos servidores e restringir o pagamento dos supersalários.

Estadão teve acesso ao conteúdo das propostas que serão apresentadas pelo deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), coordenador do Grupo de Trabalho da reforma, na Câmara. O pacote inclui uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), um Projeto de Lei (PL) e um Projeto de Lei Complementar (PLP). Veja os principais pontos:

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PEC da reforma administrativa será protocolada no Congresso e prevê mudanças para todo o setor público. Na foto, a Esplanada dos Ministérios, em Brasília.
PEC da reforma administrativa será protocolada no Congresso e prevê mudanças para todo o setor público. Na foto, a Esplanada dos Ministérios, em Brasília.  Foto: Wilton Junior/Estadão

Supersalários

A PEC restringe os chamados supersalários, que são as remunerações pagas acima do teto salarial do funcionalismo (hoje, de R$ 46,4 mil por mês).

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As verbas indenizatórias, que inflam o salário da elite do funcionalismo público com “penduricalhos”, deverão ter natureza reparatória e destinar-se exclusivamente ao pagamento de despesas realmente episódicas, eventuais e transitórias.

Será proibido o pagamento de “penduricalhos” de forma rotineira e permanente e a concessão indistinta de verba à totalidade de uma categoria, acabando com o que acontece hoje. Os auxílios de alimentação, saúde e transporte ficarão fora dessa restrição.

O orçamento dos governos para o pagamento de verbas indenizatórias terá um “teto de gastos” e não poderá crescer mais do que a inflação do ano anterior, com base nos valores pagos em 2020. Além disso, o pagamento retroativo desses valores somente poderá ocorrer por decisão judicial transitada em julgado.

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Para servidores públicos que recebem 90% ou mais do teto constitucional, os auxílios de alimentação, saúde e transporte, no total, não poderão ultrapassar 10% do salário.

A PEC também vai proibir a aposentadoria compulsória como sanção disciplinar para magistrados e membros do Ministério Público que praticarem faltas graves. Juízes e procuradores poderão ser demitidos por processo administrativo disciplinar pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) ou pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).

Férias e criação de novos ‘penduricalhos’

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A PEC proíbe férias de 60 dias, gozadas atualmente por juízes, e define que nenhum servidor tenha férias superiores a 30 dias por ano, com exceção de professores e profissionais de saúde expostos a riscos que justifiquem um período maior.

O poder público também não poderá pagar adicional de férias superior a um terço da remuneração do período e não poderá parcelar as férias em mais de três períodos.

A PEC também proíbe aumento de salário ou de parcelas indenizatórias apenas por tempo de serviço, incluindo quinquênios, e pagamento de férias ou licenças não usufruídas. Atualmente, algumas categorias usam essas vantagens para inflarem salários fora do teto constitucional.

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Novas verbas remuneratórias ou indenizatórias só serão criadas com aprovação do Congresso. Hoje, alguns órgãos das próprias categorias, como Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), criam benefícios generalizados para os servidores sem aprovação de lei.

Tabela única

A União, os Estados, o Distrito Federal e os municípios deverão implementar, por meio de lei específica, uma tabela remuneratória única para para todos os agentes públicos. Essa tabela deverá conter o número de “escadas” remuneratórias de cada cargo público, com valores entre o salário mínimo (R$ 1.518) e o teto do funcionalismo (hoje R$ 46,4 mil por mês). A remuneração inicial de uma carreira será limitada a 50% do valor do último nível da mesma carreira.

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Avaliação por desempenho

A PEC vai instituir uma exigência de avaliação dos servidores públicos por desempenho. Todo os órgãos do setor público deverão realizar avaliação periódica de desempenho dos funcionário.

A PEC preserva a estabilidade, mas, na fase do estágio probatório, que hoje dura de dois a três anos, deixa explícito que o servidor será exonerado se for verificada inaptidão para o exercício das atribuições e responsabilidades inerentes ao cargo.

Para os demais efetivos, a PEC estabelece que a progressão funcional nas carreiras e o pagamento de bônus estarão condicionados à avaliação por desempenho e a instrumentos instrumentos de governança e gestão.

Não há previsão de demissão de servidores por mau desempenho. Como incentivo, os órgãos poderão instituir um bônus por resultado, equivalente a uma 14º folha de pagamento, para aqueles que cumprirem os objetivos e as metas definidas.

Concursos públicos

Para realizar novos concursos públicos, o governo deverá fazer o chamado “dimensionamento da força de trabalho”, para identificar onde há necessidades, com metodologia definida em regulamento — que não está na PEC — e ampla divulgação pública, para planejar a alocação de pessoal.

Os concursos públicos deverão priorizar carreiras transversais, que são aquelas que contratam profissionais com alta qualificação e que ficam disponíveis para atuarem em mais de um órgão, como analista de infraestrutura e especialista em políticas públicas. O poder público deverá ainda comprovar a necessidade dessas contratações.

Os Estados e municípios poderão aderir ao Concurso Nacional Unificado (CNU) do governo federal e utilizar a base de aprovados para selecionar servidores.

Cargos comissionados

Do total de cargos na administração, no máximo 5% poderá ser reservado para cargos comissionados (destinados a não servidores e nomeados politicamente) na União, nos Estados e nos municípios. Esse porcentual poderá ser maior somente nos municípios de até 10 mil habitantes, para até 10%, em situações devidamente justificadas. No mínimo 50% dos cargos em comissão devem ser ocupados por servidores efetivos.

A União e os Estados deverão implementar o limite em dois anos após a promulgação da PEC. Os municípios terão três anos para se adaptarem. Quem não cumprir o prazo ficará impedido de criar novos cargos de comissão e funções de confiança (servidores que recebem funções de chefia).

Os ocupantes de cargos comissionados e funções de confiança serão submetidos à avaliação periódica de desempenho diferenciada dos demais servidores públicos, com objetivos e metas estabelecidos pela gestão.

Contratação de temporários por concurso

A PEC institui autoriza a contratação de servidores temporários por concurso público, criando um modelo chamado de “investidura a termo em cargo efetivo”. Nessa modalidade, os funcionários serão contratados por um período não inferior a 10 anos.

Para isso, o governo deverá demonstrar que a função é transitória e qual a necessidade daquela contratação. A quantidade de servidores temporários contratados por concursos não poderá ultrapassar 5% do total de efetivos naquele cargo ou carreira.

Planejamento estratégico

O presidente da República, o governador e o prefeito serão obrigados a divulgar, seis meses após a posse, um plano estratégico com objetivos e metas para todo o mandato que deverão orientar acordos anuais para a definição de metas e objetivos na gestão pública. São nesses acordos que estarão previstos os planos de avaliação periódica dos servidores.

Teto de gastos

A PEC institui um teto de gastos para o Judiciário, o Legislativo, os Tribunais de Contas e os Ministérios Públicos nos Estados e municípios, incluindo o pagamento de pessoal. As despesas desses órgãos não poderão ter crescimento real (acima da inflação) superior a 2,5% ao ano a partir de 2027 — o mesmo teto do arcabouço fiscal da União. Os Executivos estaduais e as prefeituras ficarão de fora desse limite.

Os municípios, exceto as capitais, com despesas de custeio administrativo que superem a arrecadação própria — sem contar as transferências obrigatórias e voluntárias — terão limites máximos de secretarias, variando de cinco a 10, conforme a população.

O governo federal e os Executivos estaduais e municipais deverão realizar uma revisão de gastos públicos de forma permanente, com avaliação periódica das despesas e realocação de recursos para políticas públicas que forem identificadas como prioritárias.

Para a União, as medidas de revisão de gastos deverão estar em um anexo específico da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), enviada todos os anos para o Congresso. O governo Lula inaugurou esse mecanismo em 2023. Com a PEC, a medida se torna constitucional.

Cartórios

As atividades dos cartórios, denominada tecnicamente de serviços notariais e de registro, são exercidas por pessoas em caráter privado, mas por delegação do poder público.

A reforma aplica um teto de remuneração aos novos titulares de cartórios, aqueles que assumirem após a aprovação da PEC, que não poderão ter retribuição líquida superior a 13 vezes o teto do STF por ano, descontadas as despesas necessárias à operação do serviço. Hoje, o valor máximo chegaria a R$ 602,8 mil por ano.

Os dirigentes dos cartórios terão as atividades encerradas compulsoriamente ao atingirem 75 anos de idade - essa regra também é aplicável apenas aos todos titulares.

Estatais e quarentena

Estatais não dependentes, exceto aquelas com capital aberto e bancos, passarão a ter de respeito o teto remuneratório do governo federal, equivalente ao salário dos ministros do STF. Hoje, essas empresas não possuem teto para remuneração. A obrigação não se estende aos membros estatutários, segundo a proposta.

Quem ocupar cargos de direção no governo, em empresas estatais e agências reguladoras deverá respeitar um período de quarentena após saírem das funções. O período será de um a a três anos, conforme definição em regulamento. Nesse prazo, essas pessoas ficam proibidas de atuarem em empresas do mesmo setor e representarem interesses de entidades com as quais tenha tido contato em razão do cargo.

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