domingo, 9 de maio de 2021

Justiça do Trabalho discute responsabilidade de empresa em morte por covid

 


Capitão Paulo Roberto Carvalho Júnior, à esquerda, morreu de covid-19 em dezembro - Arquivo Pessoal
Capitão Paulo Roberto Carvalho Júnior, à esquerda, morreu de covid-19 em dezembroImagem: Arquivo Pessoal
Juliana Dal Piva

Colunista do UOL

09/05/2021 04h00

Um processo que chegou à Justiça do Trabalho do Rio de Janeiro no fim de abril pode abrir espaço para uma discussão sobre a responsabilidade das empresas na contaminação e até morte de seus funcionários por covid-19. Como o Brasil já reúne mais de 400 mil vítimas da doença, esse processo pode ser apenas o início de outras demandas de vítimas e familiares de covid-19 no Brasil.

A família de Paulo Roberto Carvalho Júnior, 53 anos, ex-comandante do navio petroleiro João Cândido, da Transpetro, entrou com um processo pedindo o reconhecimento da responsabilidade da empresa na contaminação pelo novo coronavírus que resultou na morte dele em dezembro. O pedido é de uma pensão, a ser calculada, e indenização por danos morais à família, sua viúva e três filhos, no valor de R$ 2,75 milhões.

"O empregador tem que dar condições adequadas para tentar eliminar todas as maneiras de contágio. Se a gente for falar do comandante do navio, ele já estava há muito tempo embarcado sem nenhum sintoma e entrou uma tripulação nova e pelo menos seis estavam contaminados. O empregador coloca gente com a doença dentro da embarcação. Isso é grave", explicou o advogado João Tancredo.

Procurada, a Transpetro disse, por nota, que ainda não foi notificada da ação judicial. A empresa informou que "adota procedimentos robustos em todas as suas unidades, atuando sempre de forma diligente e dentro dos protocolos de segurança exigidos pela Anvisa e pela Marinha".

As medidas adotadas para prevenção ao contágio incluem "período de quarentena pré-embarque com monitoramento de saúde para todos os marítimos, a avaliação de saúde e testagens múltiplas, incluindo o RT-PCR antes do embarque e, a bordo, o uso obrigatório de máscaras, o distanciamento entre as pessoas e o reforço na higienização e nas demais medidas de prevenção".

Contaminação do comandante

O comandante estava embarcado com sua equipe desde o início de agosto do ano passado. Ao longo desse tempo, segundo o advogado João Tancredo, que representa a família, o navio teve embarques e desembarques de funcionários de empresas terceirizadas sem a devida testagem feita, o que teria gerado a contaminação dos funcionários que estavam confinados há meses.

Carvalho Júnior sentiu os primeiros sintomas no fim de novembro de 2020, após quatro meses embarcado. Na ocasião, outros dois tripulantes a bordo já estavam também contaminados.

Na ação apresentada à Justiça, o advogado relata que "os tripulantes da embarcação que navegava em direção ao seu destino, com a orientação da equipe médica e do próprio comandante, precisaram retornar ao Brasil para buscar ajuda médica, mas estavam a pelo menos cinco dias de distância do porto mais próximo no país".

Desse modo, apenas em 5 de dezembro o navio chegou ao porto de São Sebastião, em São Paulo, e metade da tripulação estava infectada pelo novo coronavírus. O comandante já estava com sintomas graves da doença ao chegar a UPA de São Sebastião. Segundo os registros médicos, ele já tinha "diarreia, tosse, febre e dificuldade para respirar há mais de uma semana".

Foi admitido e internado e dois dias depois transferido para a UTI da Santa Casa de São José dos Campos, Uma semana depois precisou ser entubado, mas não resistiu e morreu no dia 16 de dezembro do ano passado.

Processos pelo país

O defensor avalia, porém, que esse deve ser apenas o começo de várias ações cobrando empresas e o governo sobre a exposição durante o trabalho. "Acho que o Brasil está prestes a sofrer várias ações desse tipo. Uma coisa que ainda virá são ações contra a União por conta das omissões do governo federal e de não ter adquirido a vacina", avalia Tancredo. Ele citou a situação de policiais militares, motoristas de aplicativo, entregadores de comida, entre outras atividades que possuem caráter presencial essencial.

O advogado João Tancredo ainda recorda que há a situação dos sobreviventes da covid-19 que ficaram com lesões permanentes. "Tem gente se aposentando por ter perdido a capacidade respiratória", aponta.

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