sábado, 10 de setembro de 2016

Após críticas sobre jornada de 12 horas diárias, Temer repreende ministro



Após críticas sobre jornada de 12 horas diárias, Temer repreende ministro

Declaração de Ronaldo Nogueira cria mal-estar


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Ruído. Propostas do ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, foram classificadas de “delirantes” pela Força Sindical - O Globo / Michel Filho/8-9-2016
BRASÍLIA, RIO e SÃO PAULO - Assustado com a repercussão negativa causada pelas declarações do ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, de que o governo pretende regulamentar a jornada de 12 horas por dia, o presidente Michel Temer repreendeu o ministro e determinou que ele insista na mensagem de que nenhum direito será retirado do trabalhador. A declaração de Nogueira foi dada durante um seminário, na quinta-feira, em Brasília — e criticada ontem por especialistas e centrais sindicais. Também causou mal-estar entre congressistas da base aliada. No Palácio do Planalto, a sensação é que o ministro se atrapalhou ao falar sobre um tema tão delicado como a reforma trabalhista.
Nogueira afirmou, na quinta-feira, que a ideia do governo é manter, na proposta que pretende enviar ao Congresso, a jornada semanal de 48 horas — 44 horas, mais 4 extras — e permitir que cada categoria estabeleça, via convenção coletiva, a melhor forma de distribuir esse tempo. O teto diário, explicou o ministro, seria de 12 horas.
MAIS RESISTÊNCIA NO CONGRESSO
Segundo fontes ligadas ao presidente, diversos parlamentares ligaram para o Palácio do Planalto pedindo explicações. Os esclarecimentos tiveram de ser feitos ao longo do dia, inclusive pelo ministro, que chegou a procurar, ontem, alguns veículos de comunicação para passar a mensagem de Temer e, com isso, minimizar as críticas.
— O ministro se expressou mal na conversa com os sindicalistas, no seminário do qual participou. Ele quis dizer que o governo quer regulamentar uma coisa que já existe — disse uma fonte.
No início da tarde de ontem, o Ministério do Trabalho divulgou nota na qual afirma que a proposta de reforma trabalhista não vai elevar a jornada semanal, de 44 horas, nem a carga diária, de 8 horas. “O que está em estudo é a possibilidade de permitir aos trabalhadores, através de seus representantes eleitos e em sede de convenção coletiva, ajustarem a forma de cumprimento de sua jornada laboral de 44 horas semanais da maneira que lhes seja mais vantajosa.”
O texto afirma que a intenção do governo é regular exceções. Cita como exemplo a escala de 12 horas de trabalho por 36 horas de descanso, e o cumprimento da jornada semanal de 44 horas semanais em apenas 5 dias da semana. O ministério diz que vai continuar buscando “com afinco a modernização da legislação trabalhista” prestigiando a autonomia do trabalhador e a sua representatividade sindical.
Mas, reservadamente, líderes da base governista no Congresso admitem que a forma “atrapalhada” de divulgação das propostas pode gerar resistência de deputados e dificultar a aprovação de medidas importantes para o governo.
— Uma coisa vai gerando resistência na outra. Isso atrapalha votar a favor da PEC 241 (que estabelece teto para os gastos públicos), por exemplo — diz um líder governista, lembrando também que cresce a resistência à reforma da Previdência.
Em nota, o presidente da Força Sindical, o deputado Paulo Pereira da Silva (SD-SP), afirmou que “as propostas de reforma trabalhista e previdenciária são ideias delirantes”. O texto classifica as propostas divulgadas de “colcha de retalhos, que nada têm a contribuir com a sociedade e com a governabilidade.” E afirma que “o governo precisa ter mais prudência na divulgação de medidas, o que está sendo feito de forma atabalhoada e fatiada".
O texto defende um amplo debate com a sociedade, afirmando ser “estranho e temerário tentar fazer reformas às pressas”.
Já o secretário-geral da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Sergio Nobre, minimizou a polêmica em torno das declarações de Nogueira. Segundo ele, já existem jornadas de 12 horas, definidas em negociações entre sindicatos e empresas.
— Não dá para entender porque isso tomou essa dimensão. Jornadas de 12 horas, que respeitam o limite de 44 horas por semana, já são praticadas — afirma Nobre.
A Confederação Nacional da Indústria (CNI), por sua vez, já se posicionou a favor de formas mais flexíveis de contratação, com ampliação da jornada.
Para sociólogos do trabalho, o momento é difícil para fazer as reformas trabalhista e da Previdência.
— A reforma da Previdência e a trabalhista tocam em temas sensíveis e trarão obviamente muita tensão e resistência. O contexto pode assumir contornos explosivos — avalia Marco Aurélio Santana, sociólogo do trabalho e professor do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ.
DEBATE COM A SOCIEDADE
Santana acredita que essa resistência levará o governo a ampliar o leque de propostas para, no fim, conseguir aprovação apenas dos pontos menos polêmicos. Para o diretor-técnico do Dieese, Clemente Ganz Lúcio, a falta de uma proposta estruturada deixa a sociedade sem saber quais são as pretensões do governo:
— Vemos o ministro indicando soluções para velhos problemas trabalhistas que o movimento sindical já havia discutido com governos anteriores e que não foram adiante porque são questões complexas e sem consenso. Convencer leva tempo, e isso deve ser feito com base em uma proposta formal, para que a sociedade e o Congresso possam analisar e compreender.
O professor do departamento de Sociologia da USP Leonardo Mello e Silva também defende que as propostas de reforma sejam formalizadas e discutidas com a sociedade antes de serem enviadas ao Congresso.
— Os fóruns e espaços de negociação foram destruídos. Não há reforma sustentável sem a participação das centrais sindicais, que têm um papel político insubstituível. É indispensável a negociação — destaca o professor

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