Publicado 26/04/2021 - Atualizado 26/04/2021
Por considerar que a empresa não tomou todas as medidas para prevenir a contaminação pelo coronavírus no ambiente de trabalho e que as medidas adotadas não foram suficientes para a contenção necessária, o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região entendeu que a Covid-19 é doença ocupacional.
A decisão da 9ª Turma do tribunal trabalhista negou, de maneira unânime, um recurso interposto pelos Correios contra a decisão de primeiro grau. A ação foi originalmente proposta pelo Sindicato dos Trabalhadores dos Correios (Sindect). O juízo de piso condenou a empresa a diversas obrigações relacionadas a medidas sanitárias de contenção da Covid-19 na unidade de Poá (SP).
Ao negar provimento ao recurso, os desembargadores do TRT-2 ratificaram a decisão de obrigar os Correios a expedir comunicações de acidente de trabalho (CAT) relativamente aos empregados que contraíram Covid-19.
O colegiado mencionou que, segundo entendimento do STF, o artigo 29 da medida provisória 927/20 é inconstitucional. O dispositivo previa que os casos de contaminação pelo coronavírus não seriam considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal.
A empresa também foi condenada a adotar uma série de protocolos sanitários. Por exemplo, aplicar um questionário diário aos trabalhadores, como forma de fazer triagem dos que podem estar contaminados; considerar como suspeito de portar o vírus quem registrar temperatura corporal acima de 37,5º; afastar do trabalho presencial os empregados considerados suspeitos, com manutenção da remuneração; afastar do trabalho presencial aqueles que tiveram contato com trabalhadores que efetivamente se contaminaram; e liberar do trabalho presencial todos os trabalhadores com sintomas de Covid-19. Os Correios também devem proceder a uma limpeza diária e intensiva das instalações.
Constituição e OIT
Antes da decisão colegiada, o Juiz do Trabalho da Vara de Poá/SP, Willian Alessandro Rocha, tinha concedido liminar favorável à categoria, na qual destacou que embora a atividade da empresa seja de caráter essencial, isso não significa que ela está dispensada do cumprimento de garantir a segurança e a saúde no ambiente de trabalho adotando cuidados especiais decorrentes da pandemia da covid-19. Ele cita a Constituição e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) para corroborar sua decisão.
Nas palavras do Magistrado:
“Portanto, analisando todo o conjunto normativo, embora seja permitido à reclamada continuar o desenvolvimento da sua atividade econômica, deve ela tomar as medidas preventivas estabelecidas no Decreto Municipal de Poá n. 7.564/2020, no Decreto Estadual n. 64.884/2020, na Lei Federal n. 13.979/2020 e no Decreto Federal n. 10.282/2020.
Acrescento que a CRFB/1988 determina ser dever da coletividade, aí incluída a empregadora, defender e preservar o meio ambiente, no qual se inclui o meio ambiente de trabalho (artigo 225). Além disso, a Carta Constitucional prevê como direito fundamental dos trabalhadores a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança (artigo 7º, XXII).
Além disso, a Convenção da OIT n. 120 prevê em seus artigos 11 e 17 o seguinte:
Artigo 11.
Todos os locais de trabalho deverão ser organizados de tal maneira que a saúde dos trabalhadores não seja exposta a qualquer efeito nocivo.Artigo 17.
Os trabalhadores deverão ser protegidos por medidas apropriadas e praticáveis contra as substâncias e processos incômodos, insalubres ou tóxicos ou perigosos, seja qual for a razão. Quando a natureza do trabalho o exigir, a autoridade competente deverá prescrever a utilização de equipamentos de proteção individual.No mesmo sentido, a Convenção da OIT n. 148, cujo artigo 11, item 1 prevê:
O estado de saúde dos trabalhadores expostos ou que possam estar expostos aos riscos profissionais devidos à contaminação do ar, ao ruído e às vibrações no local de trabalho deverá ser objeto de controle, a intervalos apropriados, segundo as modalidades e nas circunstâncias fixadas pela autoridade competente. Este controle deverá compreender um exame médico anterior ao emprego e exames periódicos, conforme determine a autoridade competente.
Cito, finalmente, a Convenção n. 155 da OIT, cujo artigo 16 tem o seguinte teor:
Artigo 16
1. Deverá ser exigido dos empregadores que, na medida que for razoável e possível, garantam que os locais de trabalho, o maquinário, os equipamentos e as operações e processos que estiverem sob seu controle são seguros e não envolvem risco algum para a segurança e a saúde dos trabalhadores.2. Deverá ser exigido dos empregadores que, na medida que for razoável e possível, garantam que os agentes e as substâncias químicas, físicas e biológicas que estiverem sob seu controle não envolvem riscos para a saúde quando são tomadas medidas de proteção adequadas.
3. Quando for necessário, os empregadores deverão fornecer roupas e equipamentos de proteção adequados a fim de prevenir, na medida que for razoável e possível, os riscos de acidentes ou de efeitos prejudiciais para a saúde.
Assim, não há dúvidas de que a reclamada tem a obrigação de tomar todas as medidas para garantir a saúde dos seus empregados.”
Assim, foi concedido em parte a Liminar pleiteada pelo Sindicato, sendo determinado que a Empresa cumpra, no prazo de 48h, as seguintes obrigações:
1. Providencie a realização, às suas expensas, de testes para detecção da covid-19 em todos os seus empregados que trabalharam no mesmo setor que o empregado infectado e tiveram contato pessoal com ele e/ou com os mesmos objetos por ele manuseados;
2. Realize a limpeza de maneira imediata e intensiva (desinfecção) do CDD Poá;
3. Afaste do trabalho presencial, sem prejuízo da remuneração, todos os empregados que laboram no CDD Poá e relatem estar com os sintomas da covid-19, mantendo-os em trabalho remoto ou, não sendo possível, em licença remunerada até que sobrevenha resultado negativo de exames médicos investigativos da doença;
4. Caso seja constatado que algum empregado, além do empregado Senhor D.H.S.S., tenha contraído a doença, afaste todos os demais empregados do CDD Poá, mantendo-os em trabalho remoto ou, não sendo possível, em licença remunerada até que sobrevenha resultado negativo de exames médicos investigativos da doença;
5. Abstenha-se de determinar que os empregados lotados no CDD Poá prestem serviços em outras unidades dos Correios enquanto aguardam o resultado de exames.
Deverá ainda a ECT tomar medidas efetivas que evitem a aglomeração de empregados, garantindo que os trabalhadores mantenham distância segura entre eles (no mínimo 2 metros).
O descumprimento das obrigações acima ensejará a aplicação de multa diária de R$ 50.000,00, limitada a 10 dias, e após isto ser analisado do pedido de interdição do estabelecimento.
Para o Diretor de Assuntos Sindicais do SINTECT-SP, Milton de Jesus Miguel (Jacaré): “Mais uma vez a Justiça do Trabalho fez valer a defesa da vida e da saúde, interesses e direitos que o nosso Sindicato tem procurado alcançar”.
Processo nº 1000708-47.2020.5.02.0391
Com informações da Conjur e do Sintect/SP
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