A VEJA, Guilherme Derrite critica a alta taxa de libertação de presos em audiências de custódia e afirma que trabalho deveria ser obrigatório nas cadeias
A grave crise de segurança pública no Brasil, que vive uma escalada de crimes violentos praticados por suspeitos já com longa ficha corrida na polícia, reacende o debate sobre os gargalos na Justiça criminal brasileira. Como mostra reportagem de VEJA na edição desta semana, em mais de 2,2 milhões de audiências de custódia realizadas no país desde 2015, quatro em cada dez detidos tiveram sua prisão em flagrante convertida em liberdade provisória.
Para o secretário estadual de Segurança Pública (SSP) de São Paulo, Guilherme Derrite (PL), a legislação criminal é flexível e abre brechas para a impunidade, o que gera uma sensação de insegurança na população e incentiva bandidos a reincidirem na criminalidade. "O criminoso sabe que o custo de ser preso é baixíssimo diante das vantagens econômicas da vida
"A polícia prende, e a Justiça solta". O que o senhor pensa dessa afirmação? Penso que há uma leniência muito grande na interpretação da lei. A legislação fornece muitos benefícios para quem comet e crime no Brasil, como audiência de custódia, visita íntima, saída temporária, auxílio-reclusão e progressão de regime. Além da lei fraca, você tem a benevolência de alguns magistrados na sua aplicação. Essa premissa de que o Judiciário é obrigado a soltar vem contra o nosso respaldo do dia-a-dia, diante de crimes graves que acontecem.
No Brasil, a cada quatro pessoas presas, uma volta à cadeia menos de dois anos depois. Qual éa explicação para essa taxa de reincidência criminal? A resposta é o baixo custo do crime. O criminoso a uma decisão racional baseada
tempo eu vou ficar preso?". Para começar a cumprir pena em regime fechado, tem que ser condenado a no mínimo oito anos de prisão, mesmo se for réu confesso. Nesse meio-tempo, tem todos aqueles benefícios aos presidiários. O criminoso sabe que o custo de ser preso é baixíssimo perto das vantagens econômicas que, infelizmente, a vida delituosa traz.
"Há uma leniência muito grande na interpretação da lei. A legislação fornece
muitos benefícios para quem comete crime no Brasil"
O Brasil tem a terceira maior população carcerária do mundo, chegando a quase 890 mil presos entre todos os regimes, e uma alta taxa de encarceramento. O que explica esses números tão grandes?
Primeiro, eu não acho esse número alto, não se pode comparar o Brasil com países muito menos populosos. Segundo, quando se fala em população carcerária, do meu ponto de vista, você não pode considerar o regime domiciliar como pena, eu sou contra esse modelo. Que pena o criminoso está cumprindo na casa dele? Você se lembra do delegado Mauro Guimarães, vítima de latrocínio no ano passado na região da Lapa? O criminoso já tinha sido preso dez vezes, desde que era adolescente, e naquele momento va gozando do benefício da prisão
domiciliar. Eu vejo como mais um causador do baixo custo do crime.
Boa parte das cadeias, hoje, estão sob o comando das facções criminosas e operam como escolas do crime organizado. Qual é a dificuldade do Estado em manter o controle nas prisões? Eu garanto que São Paulo, hoje, não enfrenta mais esse problema. Temos um controle muito eficaz sobre a população carcerária e de todas as portas do sistema prisional, e isso é resultado da nossa política de incentivo ao trabalho. Eu só vejo a opção de ressocialização por meio do trabalho. O detento que trabalha pode auto-sustentar o próprio custo ao Estado, aprender um ofício e formar uma poupança ou ajudar a família que está fora da cadeia. Isso eu acho que precisa corrigir na lei, o trabalho deveria ser uma obrigação para o preso, não uma opção.
Segurança pública é uma área multidisciplinar, mas os governos investem muito nas polícias e cadeias e pouco em políticas para ex-presidiários. Depois que o preso deixa a cadeia, como o Estado pode garantir que ele não vai reincidir na criminalidade? Isso é um problema de interpretação, querer atribuir ao Estado uma responsabilidade que é do indivíduo. A responsabilidade de cada um de nós é fazer o correto. O papel do Estado, no meu ponto de vista, é dissuadir o indivíduo da vontade delituosa encarecendo o custo do crime. Não são jovens indefesos saindo da prisão, são assaltantes, traficantes e latrocidas, isso não pode ser atribuído ao poder público.
"Imagine chegar a um policial e dizer: "vamos trabalhar, porque, de cada dez criminosos que vocês
prenderem, quatro vão sair da delegacia antes de vocês"
As audiências de custódia, nas quais o juiz analisa a legalidade de cada prisão, completam dez anos de existência em 2025. Em 59% dos casos, a prisão preventiva é mantida, enquanto 41% das sessões concedem a liberdade provisória.
Como o senhor avalia esse mecanismo? Tenho que ser coerente e defender o fim da audiência de custódia. Esse índice é altíssimo. Imagine chegar a um policial que está arriscando a sua vida diariamente na rua e dizer: "vamos trabalhar, porque de cada dez criminosos que vocês prenderem, quatro vão sair da delegacia antes de vocês". Mas conhecendo o Congresso, eu acho que não vai acabar. Se limitasse o acesso às audiências para reincidentes, integrantes de organizações
Linosas, autores de crimes hediondos ou mediante violência e grave ameaça, o Brasil já seria outro.
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