A partir de diagnóstico inédito sobre a gestão de vagas no sistema socioeducativo com foco no funcionamento das Centrais de Vagas, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) lança nesta sexta-feira (1/12) relatório com informações atualizadas sobre a situação das unidades destinadas a adolescentes a quem se atribui prática de ato infracional. Os dados coletados em 2022 apontam 22.073 vagas no sistema socioeducativo, com mais de 11 mil adolescentes restritos de liberdade – em todas as unidades da federação, a taxa de ocupação informada está abaixo de 100%.
Acesse a íntegra da publicação Centrais de Vagas do Socioeducativo – Relatório Anual
O relatório, que terá periodicidade anual de modo a incentivar a qualificação da produção de dados, partiu de questionário preenchido pelas 27 unidades da federação para avaliar o funcionamento das Centrais de Vagas do sistema socioeducativo. Regulamentadas pela Resolução CNJ n. 367/2021, as Centrais de Vagas são ferramentas geridas pelo Executivo com apoio do Judiciário para gestão e coordenação das vagas em unidades socioeducativas de internação, semiliberdade e internação provisória. O objetivo é manter a ocupação abaixo de 100%, dando cumprimento à decisão do Supremo Tribunal Federal no HC 143.988.
Em 2022, 15 centrais haviam sido implementadas ou qualificadas a partir da Resolução 367, número que já passou para 21 em 2023. O relatório identificou ainda que há estados que têm gestão de vagas mas não têm centrais no modelo orientado pelo CNJ, e ainda, unidades da federação que criaram grupos de trabalho para discutir o assunto. O fomento à expansão e qualificação das centrais de vagas é um dos 27 temas trabalhados pelo programa Fazendo Justiça, coordenado pelo CNJ em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento para acelerar transformações na privação de liberdade.
Acesse o Manual do CNJ sobre o serviço da Central de Vagas no Socioeducativo
Para o coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas do CNJ (DMF/CNJ), Luís Lanfredi, qualificar dados sobre o sistema socioeducativo é uma das prioridades do CNJ. “A partir de um olhar especializado sobre as Centrais de Vagas, política fundamental para dar cumprimento à decisão da Suprema Corte que proíbe superlotação em unidades socioeducativas, garantimos também um olhar sobre o sistema, suas potencialidades e desafios. E entre esses desafios, o relatório aponta a necessidade de qualificarmos a produção de dados que ainda apresentam lacunas significativas, atendendo inclusive a demandas nacionais e internacionais direcionadas ao Brasil nesse sentido”.
O lançamento ocorre no mesmo período em que são apresentados os relatórios sobre o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), reforçando a importância de se estabelecer uma tradição na produção periódica de dados sobre o sistema socioeducativo que permita o comparativo de série histórica. O último levantamento sobre o Sinase foi publicado em 2019 com dados referentes a 2017.
De acordo com o juiz auxiliar da Presidência do CNJ com atuação no DMF Edinaldo César Santos Junior, o relatório evidencia avanços ocorridos nos últimos anos em torno do tema da gestão de vagas, mas que ainda há um espaço importante de diálogo e colaboração entre o CNJ e as unidades da federação para que essa gestão de vagas ocorra em padrões de excelência. “O relatório aponta, por exemplo, que nenhum tribunal atendeu integralmente aos critérios estabelecidos pela resolução. O bom funcionamento da central de vagas se relaciona diretamente com uma melhor ocupação dessas unidades, de modo alinhado à prioridade absoluta que deve ser endereçada a nossos e nossas adolescentes segundo a Constituição Federal”.
Contexto e respostas às determinações legais
No modelo de centrais de vagas difundido pelo CNJ, a cada decisão de internação, o magistrado ou magistrada deve solicitar à Central de Vagas gerida pelo Executivo uma vaga para o adolescente ou a adolescente a quem se atribua o ato infracional. O diferencial do modelo difundido pelo CNJ é o cumprimento do que está determinado no HC 143.988, decisão histórica para o sistema socioeducativo que estabelece a obrigatoriedade do princípio do numerus clausus, vedando a superlotação e orientando a criação de estratégias para a gestão de vagas.
“As centrais surgem como uma resposta direta a essa determinação, representando um salto qualitativo na gestão do sistema socioeducativo. Ao evitar a superlotação, a metodologia aprimora a porta de entrada com uma maior racionalização da ocupação e introduz ferramentas essenciais para a gestão das vagas, como a lista de espera”, detalha a coordenadora do eixo do programa Fazendo Justiça que atua no sistema socioeducativo, Fernanda Machado Givisiez.
Atualmente, há centrais de vagas segundo o modelo difundido pelo CNJ em Roraima, Mato Grosso do Sul, Goiás, Mato Grosso, Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná, Espírito Santo, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Maranhão, Ceará, Rio Grande do Norte e Pernambuco. Neste ano, Amazonas, Amapá, Acre, Pará, Tocantins e Paraíba também inauguraram suas centrais de vagas, mas as informações não constam do relatório em razão da data de corte para obtenção dos dados.
Já nos estados do Piauí, Bahia, Sergipe e Alagoas, a política ainda não foi implementada, mas trabalham localmente em Grupos de Trabalho para sua implantação. No caso de Rondônia e Distrito Federal, embora realizem a gestão das vagas, não adotavam o modelo específico das Centrais de Vagas até a data de corte.
Também identificou-se que 48% das UFs realizam coleta de dados sobre a gestão de vagas e 41% das UFs usam sistema eletrônico para gestão de vagas, sendo que 19% das UFs publicam anualmente painel de indicadores com informações sobre vagas no sistema.
Dados gerais
Das 22.073 vagas disponíveis no sistema, 66% são designadas para internação, 21% para internação provisória e 13% para semiliberdade. No perfil dos adolescentes, 75% estão em internação, 17% em internação provisória e 8% em semiliberdade – o Rio de Janeiro não enviou dados sobre o perfil dos adolescentes. O relatório ainda mostra que há uma proporção maior de pardos (57%) e pretos (19%) em unidades socioeducativas no comparativo com o percentual encontrado na população brasileira, de 47% e 9%, respectivamente.
Há uma média nacional de 2,96 agentes socioeducativos por adolescente/jovem, enquanto a média da equipe técnica é de 0,46 profissional por adolescente/jovem. Os atos infracionais mais frequentes são roubo (45%) e tráfico de drogas (22%). De acordo com Fernanda Givisiez, os dados sobre o sistema não são definitivos porque a equipe técnica responsável pelo relatório identificou várias lacunas. “De qualquer modo, optou-se por se seguir com a sistematização e publicação, com a perspectiva de criarmos parâmetros fixos para que esses dados possam ser aprimorados nos próximos anos”.
Texto: Natasha Cruz
Edição: Débora Zampier
Agência CNJ de Notícias
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