RIO - Na reunião em que atualizou o rol de cobertura obrigatória pelos planos de saúde, nesta quarta-feira, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) firmou um novo entendimento sobre a abrangência da lista que pode prejudicar os consumidores que buscam tratamentos ainda não listados pela reguladora.

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O rol quer era considerado até então a cobertura mínima que deveria ser oferecida ao consumidor, passou a ser visto como "taxativo" e exaustivo.

Isso quer dizer que apenas os procedimentos listados pela ANS terão cobertura do planos de saúde. Passa a ser uma liberalidade dos planos a oferta de outras coberturas.

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A decisão da ANS pode ter impacto ainda numa ação em trâmite no Superior Tribunal de Justiça sobre o tema. Na avaliação da Ana Carolina Navarrete, pesquisadora em saúde do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), a mudança de entendimento da ANS foge da competência da própria agência:

— A agência está divergindo da própria lei que caracteriza o rol como um lista de procedimentos de cobertura mínima. Ela diz que o rol é exaustivo e mesmo assim que os planos podem oferecer outras terapias o que é absolumente contraditório, e inoportuno no momento em que o STJ analisa o tema.

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ANS firmou um novo entendimento sobre a abrangência da lista que pode prejudicar os consumidores que buscam tratamentos ainda não listados pela reguladora. Foto: Arquivo
ANS firmou um novo entendimento sobre a abrangência da lista que pode prejudicar os consumidores que buscam tratamentos ainda não listados pela reguladora. Foto: Arquivo

Ela explica:

— Entendemos que neste momento em que o STJ está debruçado sobre esse assunto não cabe à ANS mudar a regra. Cabe ao STJ dizer sobre esse direito e esperamos que o faça em atenção à jurisprudência já consolidada nos estados e na sua 3ª Turma.

ANS diz que não houve mudança de entendimento

Procurada, ANS informou que não houve mudança de entendimento, que "sempre considerou o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde como sendo exaustivo ou taxativo", mas admitiu que alterou a redação para se adequar ao entendimento do STJ.

"As operadoras continuam sendo obrigadas a cobrir todos os procedimentos e eventos em saúde estabelecidos no Rol estipulado pela ANS e todos os demais que eventualmente estejam estabelecidos em contrato", diz comunicado enviado ao GLOBO.

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Segundo a agência, "a troca do uso da expressão "cobertura mínima" para a redação "...considera-se exaustivo o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde..." tem o objetivo de trazer para a resolução normativa da ANS o entendimento adotado no ano passado pela 4ª Turma do STJ.

Impacto em ações judiciais

O advogado Rafael Robba, especializado em Direito à Saúde do escritório Vilhena Silva Advogados, também destacou  o risco desse novo entendimento ter impacto em ações judiciais sobre demandas de usuários que dependem de tratamentos que não estão listados pela ANS.

Entre os procedimentos que devem ser cobertos a partir de agora pelos planos de saúde estão exames, terapias e cirurgias para diagnóstico e tratamento de doenças do coração, intestino, coluna, pulmão, mama Foto: Arquivo
Entre os procedimentos que devem ser cobertos a partir de agora pelos planos de saúde estão exames, terapias e cirurgias para diagnóstico e tratamento de doenças do coração, intestino, coluna, pulmão, mama Foto: Arquivo

— A ANS até aqui sempre tratou o rol como sendo um de cobertura mínima. Ou seja, aquilo que os planos são minimamente obrigados a fornecer. Várias ações na Justiça discutem a cobertura de tratamentos que não foram incorporados a este rol — diz o advogado

Ele continua:

—  Neste momento, em que o STJ está com uma ação discutindo se o rol é taxativo ou não, a ANS vem dando força para o argumento das operadoras para negar a cobertura aos usuários dos planos. É um impacto ruim para os consumidores. Há na Justiça uma demanda grande por tratamentos não incorporados — explica Robba.

A ANS também alterou o entendimento sobre a cobertura de medicamentos chamados de "off label", ou seja, cuja indicação inicial é feita para determinada doença, mas que depois a comunidade científica avalia que poderia ser usado também para o tratramento de outras enfermidades.

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Neste caso, a agência classificou, em minuta aprovada nesta quarta-feira, estes remédios como experimentais e que não têm cobertura pelos planos de saúde.

Para Ana Carolina,  a agência não poderia classificar se um medicamento é ou não experimental já que a competência seria da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa):

— O próprio Superior Justiça Justiça já definiu que o tratamento de com remédios chamados off label, se for indicado pelo médico, deve ter cobertura — afirma.

 

 

Foram incluídos os seguintes procedimentos:

  • Enteroscopia do Intestino Delgado com Cápsula Endoscópica: exame para diagnóstico de sangramento intestinal de causa obscura
  • Ablação Percutânea por Corrente de Crioablação para Tratamento da Fibrilação Atrial Paroxística: terapia para tratamento de problema cardíaco
  • Ensaio para Dosagem da Liberação de Interferon Gama: exame para detecção de tuberculose latente em pacientes imunocomprometidos
  • Artroplastia discal de Coluna Vertebral: cirurgia para tratamento de problemas da coluna cervical
  • Cirurgia Endoscópica da Coluna Vertebral - Hérnia de Disco Lombar: cirurgia para tratamento de hérnia de disco lombar
  • Implante Transcateter de Prótese Valvar Aórtica (Tavi): cirurgia para tratamento de problema cardíaco
  • Radioterapia Intraoperatória por Elétrons (Ioert): terapia para tratamento de câncer de mama
  • Consulta com enfermeiro obstetra
  • Calprotectina, Dosagem fecal: exame para detecção de inflamação intestinal
  • Razão do Teste Azão de sFlt-1/PlGF: exame para diagnóstico de risco de pré-eclâmpsia
  • Terapia por pressão negativa: terapia para cicatrização de feridas agudas ou crônicas e queimaduras de segundo e terceiro graus
  • Osteotomia da mandíbula e/ou maxilar com aplicação de Osteodistrator: cirurgia para correção de deformidade na mandíbula
  • Hemodiafiltração online: terapia para doença renal crônica em estágio avançado e com cardiopatias.
  • PD-L1 – Detecção por técnicas Imunohistoquímicas: exame para detecção de expressão do PD-L1 em material de biópsia de câncer de pulmão
  • FLT3 – PESQUISA DE MU

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Alteração de Diretrizes de utilização

  1. Tomografia de Coerência Óptica: amplia cobertura do procedimento para pacientes com glaucoma
  2. Implante de Monitor de Eventos (Looper implantável): amplia cobertura do procedimento para pacientes pós-acidente vascular cerebral criptogênico ou ataque isquêmico transitório com causa indeterminada com suspeita de fibrilação atrial
  3. Análise molecular de DNA: inclusão do exame de “SEQUENCIAMENTO COMPLETO DO EXOMA” para investigação de deficiência intelectual de causa indeterminada e inclusão de outras especialidades para a solicitação do procedimento Análise Molecular de DNA
  4. Transplante Alogênico de Medula Óssea: alinhamento com as indicações do Ministério da Saúde para o transplante de células tronco hematopoiéticas

Veja a lista de medicamentos

Tratamento de câncer

  1. ABEMACICLIBE: mama
  2. RIBOCICLIBE: mama
  3. ALECTINIBE: pulmão
  4. ESILATO DE NINTEDANIBE: pulmão
  5. OSIMERTINIBE: pulmão
  6. CABOZANTINIBE: rins
  7. REGORAFENIBE: fígado
  8. LENVATINIBE: fígado
  9. COBIMETINIBE: melanoma
  10. DABRAFENIBE EM COMBINAÇÃO COM TRAMETINIBE: melanoma
  11. APALUTAMIDA: próstata
  12. ENZALUTAMIDA: próstata
  13. CITRATO DE IXAZOMIBE: mieloma
  14. LENALIDOMIDA_MIELOMA_IND1_REFRATÁRIO/RECIDIVADO: mieloma
  15. LENALIDOMIDA_MIELOMA_IND2_TRATAMENTO DE MANUTENÇÃO: mieloma
  16. LENALIDOMIDA_MIELOMA_IND3_SEM TRATAMENTO PRÉVIO: mieloma
  17. LENALIDOMIDA_SIND. MIELODISPLÁSICA: mieloma
  18. IBRUTINIBE_LINFOMA DE CÉLULAS DO MANTO: linfoma
  19. IBRUTINIBE_LLC_IND1_REFRATÁRIOS/RECAÍDOS: leucemia linfocítica crônica
  20. IBRUTINIBE_LLC_IND2_PRIMEIRA LINHA: leucemia linfocítica crônica
  21. VENETOCLAX_LLC: leucemia linfocítica crônica
  22. VENETOCLAX_LMA: leucemia mieloide aguda
  23. MIDOSTAURINA_LMA: leucemia mieloide aguda
  24. NILOTINIBE_LMC: leucemia mieloide crônica

Tratamento de doenças inflamatórias, crônicas e autoimunes

  1. ALENTUZUMABE: esclerose múltipla
  2. NATALIZUMABE: esclerose múltipla grave com rápida evolução
  3. OCRELIZUMABE: esclerose múltipla e formas recorrentes
  4. BETAINTERFERONA 1ª: esclerose múltipla
  5. ACETATO DE GLATIRÂMER: esclerose múltipla
  6. ADALIMUMABE: hidradenite supurativa (doença de pele crônica inflamatória)
  7. OMALIZUMABE: urticária crônica
  8. ADALIMUMABE: uveíte
  9. BENRALIZUMABE: asma
  10. MEPOLIZUMABE: asma
  11. OMALIZUMABE: asma
  12. ADALIMUMABE: psoríase
  13. ETANERCEPTE: psoríase
  14. GUSELCUMABE: psoríase
  15. INFLIXIMABE: psoríase
  16. IXEQUIZUMABE: psoríase
  17. SECUQUINUMABE: psoríase
  18. USTEQUINUMABE: psoríase
  19. GOLIMUMABE: retocolite ulcerativa (doença inflamatória intestinal crônica)
  20. INFLIXIMABE: retocolite ulcerativa
  21. VEDOLIZUMABE: retocolite ulcerativa

Outros medicamentos

  1. TERAPIA INTRAVENOSA COM ÁCIDO ZOLEDRÔNICO PARA DOENÇA DE PAGET (deformidades ósseas)

Eficácia e impacto financeiro

A ANS estabelece dois critérios para análise de incorporação de novos procedimentos. O primeiro é a  eficácia do tratamento .   O segundo é o  impacto financeiro , ou seja, o recurso necessário para que a operadora ofereça o novo procedimento aos beneficiários.  As operadoras alegam que as inclusões têm custos altos.

Ao todo, a agência recebeu  30.658 propostas  de contribuição para atualização do rol.  Somente 246 propostas foram consideradas aptas pela ANS  para seguir para a análise técnica e a posterior discussão no âmbito do Cosaúde, por atenderem a "critérios de elegibilidade necessários".

Tratamento oncológico

Em 2018, ano da última atualização do rol, foram incorporados 18 novos procedimentos e sete termos descritivos ou diretriz de utilização. Além de procedimentos e ampliação de coberturas, o rol de procedimentos, a partir de 2014, também passou a incorporar o fornecimento de medicamentos, especialmente para tratamento oral contra o câncer.

Procedimentos recusados

Entre os procedimentos sugeridos para inclusão no rol de cobertura obrigartória está o tratamento cirúrgico para pacientes com Diabetes Tipo 2 - que não conseguem o controle da doença por meio de medicamentos. Os procedimentos não terãoa cobertura dos planos de saúde.

Durante a reunião da diretoria colegiada da Agência Nacional de Saúde (ANS), a área técnica manteve a recomendação de não inclusão do procedimento no rol de procedimentos obrigatórios dos planos de saúde.

— A não recomendação da cirurgia metabólica demonstra que a ANS está deixando de ouvir a comunidade científica, entidades médicas e a população que sofre com a doença — declarou Fábio Viegas, presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica, uma das entidades que contribuiu cientificamente para a inclusão do tratamento no rol da ANS