A PEC 66/2023 está prestes a transformar significativamente a previdência dos servidores públicos estaduais e municipais, impondo uma série de mudanças que merecem uma análise crítica aprofundada. O projeto, aprovado no Senado e atualmente em tramitação na Câmara dos Deputados, promete centralizar as regras previdenciárias e trazer consequências profundas para a vida dos servidores. Sob a relatoria do senador Carlos Portinho (PL) e com uma emenda proposta pelo senador Alessandro Vieira (MDB), essa proposta tem sido alvo de intensas discussões — e não são poucas as razões para essa preocupação.
A principal crítica à PEC 66/2023 é sua ameaça direta à autonomia dos estados e municípios. Ao exigir que todos os entes federativos adotem as regras da Reforma da Previdência de 2019 (EC 103/2019), a proposta retira a capacidade das unidades federativas de legislarem sobre seus próprios regimes previdenciários. Isso significa que, mesmo que um estado ou município tenha implementado reformas que consideram adequadas às suas necessidades, eles se verão forçados a seguir as normas da União, a menos que optem por regras ainda mais rigorosas. Esse movimento não apenas centraliza o controle sobre a previdência, mas também desconsidera as particularidades e os contextos locais que muitas vezes justificam abordagens diferentes.
A PEC 66/2023 propõe mudanças que podem afetar diretamente os direitos dos servidores públicos. A imposição das regras federais, como o aumento da idade mínima para aposentadoria e a revisão das alíquotas de contribuição, pode representar uma perda significativa para muitos servidores que já usufruem de sistemas previdenciários locais mais adequados às suas realidades. O aumento das exigências pode resultar em aposentadorias mais tardias e benefícios reduzidos, desconsiderando as especificidades e necessidades de cada categoria.
Outro ponto controverso da PEC é a limitação do pagamento de precatórios, estabelecendo um percentual fixo da Receita Corrente Líquida (RCL) para esse fim. Embora essa medida possa proporcionar alívio financeiro para os municípios, ela pode ter um impacto devastador para os servidores que aguardam há anos o recebimento de valores reconhecidos judicialmente. Em grandes municípios, essa limitação pode resultar em décadas de espera, prejudicando severamente o direito dos credores e exacerbando a crise de justiça.
A tramitação apressada da PEC, sem um debate público adequado, é um ponto de grande preocupação. As emendas, especialmente a que inclui a reforma da previdência, foram introduzidas sem o tempo necessário para discussão ampla com a sociedade e os representantes dos servidores. A falta de participação e o caráter abrupto das mudanças deixam pouco espaço para ajustes que possam respeitar as particularidades locais e os direitos dos servidores.
Embora a PEC permita o parcelamento das dívidas previdenciárias em até 300 meses, a questão da sustentabilidade financeira a longo prazo permanece. Essa medida pode simplesmente adiar o problema financeiro dos municípios, agravando a crise fiscal no futuro. Além disso, a mudança constante das regras e a imposição federal criam uma insegurança jurídica que pode afetar tanto os servidores quanto a administração pública.
A PEC 66/2023, ao centralizar a previdência e limitar os precatórios, revela-se uma proposta que pode trazer sérios prejuízos para servidores e entes federativos. A falta de debate adequado e a imposição de regras uniformes sem considerar as necessidades locais são alarmantes e exigem uma revisão cuidadosa. É imperativo que a Câmara dos Deputados analise profundamente essas questões antes de qualquer aprovação final, garantindo que os direitos dos servidores e a autonomia dos entes federativos sejam respeitados.
(*) Geane Lina Teles é presidente do Sispmur
(*) Danilo Ikeda é diretor executivo do IMPRO
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