sábado, 22 de julho de 2023

proposta de reforma trabalhista trará nova contribuição sindical

 

MINISTÉRIO DO TRABALHO

Luiz Marinho:

Ao JOTA, o ministro falou sobre sua volta à pasta, reforma trabalhista, folha de pagamento e do Conselho do FGTS

luiz marinho
Ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho/ Crédito: José Cruz/Agência Brasil

Luiz Marinho voltou ao comando do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) em janeiro, 18 anos depois da primeira passagem pela chefia da pasta (meados de 2005 a 2007). Em entrevista ao JOTA, ele afirmou que, desde então, dedica-se a “reconstruir” o ministério e, agora, prepara um projeto de lei a ser enviado ao Congresso revisando pontos da reforma trabalhista aprovada no governo Michel Temer (2017). “A reforma que o Temer fez é devastadora do ponto de vista dos direitos”, considera.

As sugestões de mudança devem ser definidas até o fim de julho. O ministro assegura que não haverá revogação unilateral da reforma. “Não vai ter revogaço. Temos um governo democrático, de composição com uma base ampla e sabemos as contradições da sociedade no mercado de trabalho e no Congresso”, afirma.

Entre os pontos em discussão, estão mudanças na terceirização, que, segundo Marinho, contribuem para o aumento de casos de trabalho análogo à escravidão. Outro será a criação de uma contribuição sindical sobre serviços prestados pelos sindicatos com impacto em toda a categoria representada, como as negociações coletivas.

Marinho antecipa, ainda, temas da próxima reunião do Conselho Curador do FGTS, marcada para 25 de julho, e comenta mudanças na desoneração da folha de pagamento que gostaria de ver em discussão na reforma tributária em apreciação no Senado.

Leia a seguir os principais trechos da entrevista ao JOTA do ministro do Trabalho e Emprego.

Retorno ao Ministério

O senhor foi ministro do Trabalho entre 2005 e 2007. Como tem sido voltar ao cargo?

Em 2005, assumi dentro de um planejamento da reeleição de Lula, que me pediu para que eu trabalhasse para estabelecer uma relação madura e segura com os movimentos sociais, em particular com o movimento sindical, com o qual, até ali, havia muitos atritos. Naquele momento não existiam ainda políticas de valorização do salário mínimo, correção das injustiças em relação à tabela do Imposto de Renda, mas já havia muitas coisas andando, como política de capacitação e qualificação, que precisava ser acelerada. Era um patamar completamente diferente de agora. 

O cenário era muito diferente do que encontrou em 2023?

Em 2005, o ministério estava organizado, bastava ajustar qual ritmo dar em cada política pública. Agora, não. Estamos tendo que reconstruir o ministério, a Fundacentro (Fundação Jorge Duprat Figueiredo, de Segurança e Medicina do Trabalho), que é nosso braço distribuído de pesquisa para saúde, trabalho e segurança do trabalho para respaldar decisões. Hoje, há situação precária de fiscalização, não tem homologação, os trabalhadores ficaram à mercê da própria sorte, e têm que confiar plenamente no patrão. Isso não existe em nenhum lugar do mundo. 

Reforma trabalhista

Houve mudanças desde então, como a reforma trabalhista aprovada no governo Michel Temer. Como avalia a reforma?

A reforma que Temer fez é devastadora do ponto de vista dos direitos. Traz a perversidade de levar uma insegurança jurídica nas relações, criando o negociado sobre o legislado, inclusive na negociação individual. Isso não existe em lugar nenhum do mundo em país democrático. Os governos Temer e Bolsonaro quase destruíram as organizações sindicais, enfraqueceram as negociações coletivas, retomaram a fome e a miséria, destruíram tudo que os governos Lula e Dilma tinham construído nessa área, fecharam os ministérios do Trabalho e da Previdência. Do ponto do Trabalho, é devastador o que esses dois governos representam.

O governo vai sugerir mudanças na reforma trabalhista aprovada na gestão Temer?

Podíamos fazer um projeto de lei e mandar para o Congresso. Mas é preciso saber exatamente as dificuldades que temos para fazer alguns [ajustes] andarem lá.

Revogar a reforma está nos planos?

A opção foi sair da história que muitos desejavam, de fazer um revogaço puro e simples, por canetaço. Não vai ter revogaço. Temos um governo democrático, de composição com uma base ampla e sabemos as contradições no mercado de trabalho e no Congresso. Portanto, teremos mais chances se a gente conseguir [debater as mudanças] nos fóruns tripartites, o que já fazíamos nos governos Lula 1 e 2, e Dilma, com as plenárias, as conferências, os conselhos. Há um conjunto de ações, como as comissões tripartites permanentes para pensar novas normas regulamentadoras, infralegais e conjuntos de legislações. A gente dialoga bastante para as coisas fluírem de maneira tranquila.

Será preciso dialogar também com o Congresso, não?

A tramitação de leis  no Congresso exige construção de entendimento. Do ponto de vista da legislação trabalhista, é preciso rever pontos da perversidade que pairou sobre a última reforma, como é o caso da terceirização, o desmonte das condições de custeio dos sindicatos e o fim da homologação. Há várias questões sobre as quais é necessário voltar a refletir e debater para que se convença as lideranças empresariais e trabalhadoras. A partir dessa construção de entendimento, é possível facilitar a tramitação desses pontos no Congresso.

Será enviado um projeto de lei ao Congresso?

O grupo tripartite que trata do fortalecimento da negociação coletiva, junto com a questão do funcionamento sindical, está trabalhando com o compromisso de, até o fim de julho, me entregar uma formatação desse processo para que a gente transforme rapidamente em projeto de lei para encaminhar ao Congresso, com revisão de pontos da legislação trabalhista. Assim como a lógica de pensar a reconstrução dos sindicatos.

O que pode ser mudado, por exemplo?

Se você fez um contrato coletivo e não renovou, porque o empregador está dificultando as negociações, a cláusula desse contrato tem validade enquanto outro contrato não substituí-lo. Isso acabou na última reforma. Se o contrato coletivo tem valor de lei, ele não pode expirar em uma data, a não ser que esteja lá [registrado que] ‘esta cláusula vale por tempo determinado’.

A terceirização também deve ser alvo de sugestões de mudanças? 

terceirização é um item que deve ser visitado porque ela ficou ampla demais, liberou geral. Isso tem levado à fragmentação e à precariedade nas relações do trabalho, ao trabalho análogo à escravidão. As operações, na grande maioria, não se dão na atividade principal do contratante, ocorrem exatamente em um dos elos da terceirização. Muitas estão na terceira ou quarta subcontratação. Infelizmente, o Supremo Tribunal Federal tem colaborado com essa visão, mas acho equivocado dizer que as terceirizações estão consagradas e podem ser feitas sem nenhuma responsabilidade, porque temos que responsabilizar o principal elo da cadeia. Se eu subcontratei alguém, tenho que ter responsabilidade com o trabalhador e saber se a empresa subcontratada tem capacidade de arcar com os compromissos numa homologação, da rescisão de contrato, para [pagar] férias, no recolhimento do Fundo de Garantia.

Nova contribuição sindical

Como pode ser a reconstrução de sindicatos no contexto de mudanças na reforma trabalhista?

É preciso que haja consciência de que há sindicatos altamente representativos e outros que não representam ou representam pouco. [Na percepção do governo] a lógica é pensar em mandato de sindicato, seja do trabalhador ou dos empregadores, de no máximo de quatro anos, flexibilidade de eleição, transparência e prestação de contas aos associados. 

Pode haver uma nova fonte de renda para a estrutura sindical? 

É preciso reconstruir as finanças dos sindicatos, criar esse conceito, mas com razoabilidade. Enxergamos que, além da mensalidade que está no estatuto do sindicato para os associados, é preciso criar uma contribuição compulsória quando das negociações coletivas para o conjunto da categoria.

Todos pagariam essa contribuição, mesmo que não seja sindicalizado?

Se o sindicato presta um serviço e você se beneficia, é justo que contribua com essa prestação de serviço, como, por exemplo, as negociações coletivas. O sindicato faz o investimento quando sua direção vai ao Congresso conversar com deputados e senadores para pensar a legislação trabalhista de interesse dos trabalhadores. Então, é justo que o conjunto da categoria contribua para a manutenção desse sistema. Pode fazer oposição? Sim. Se alguém discorda, tem que ir na assembleia buscar convencer [do contrário] para não ter aberrações e abusos. É um pouco a lógica do que se está pensando [no ministério] e vale para trabalhadores e empregadores. É uma contribuição negocial e, portanto, é preciso ter uma contrapartida de serviço. Ou seja, tem que ter uma convenção coletiva, cláusula econômica e um benefício conjunto da categoria para justificar uma contribuição.

Seria similar ao extinto imposto sindical?

É diferente da contribuição sindical, que era definida e todo ano tinha aquele valor e ponto. Não tinha nem o direito de falar quero ou não quero nem individual nem coletivo. Hoje, os sindicatos estão com baixíssima representatividade e uma das razões é o pouco poder econômico que passaram a ter. É preciso que o sindicato tenha condições. Evidente que tem que ser respeitada a democracia, transparência, tem que ter eleição, renovação e acordo. Não pode cobrar uma contribuição de todos os trabalhadores, independente se é sócio ou não, se não prestou um serviço para o conjunto da categoria.

Folha de pagamento

O Senado aprovou a desoneração da folha por mais quatro anos, mas a Fazenda gostaria de discutir isso na reforma da renda. Qual sua avaliação?

Com a reforma tributária, a lógica é fazer uma transição da folha para o IVA, o imposto de valor agregado. Tem que calibrar bem para pensar onde tem a sustentabilidade do sistema previdenciário. Se mantiver a contribuição vinculada à folha de pagamento, você sacrifica os setores de grande impacto de mão de obra, como muitos setores reclamam. A empresa altamente tecnológica, com pouca mão de obra, quando remunerada a folha, é beneficiada, e o setor que tem grande impacto de mão de obra é prejudicado. Como calibrar isso? Se transferir a priori [a base de contribuição] para faturamento, por exemplo, poderia beneficiar os setores de grande impacto de mão de obra. Ou seja, vai facilitar mais contratações, pode aumentar o emprego formal. E o setor de alta lucratividade e baixíssima intensidade de mão de obra aumentaria a sua contribuição, o que na minha visão é justo. Esse é um processo que, evidentemente, vai ser muito discutido por todo mundo, gostando ou não, para encontrar um equilíbrio.

Há outros pontos da reforma tributária acompanhados pelo Ministério do Trabalho?

Outra coisa que é preciso corrigir, com o fim da DRU [Desvinculação das Receitas da União] e as maluquices dos governos Temer e Bolsonaro, acabou-se vinculando a despesa previdenciária no FAT. É o Fundo de Amparo ao Trabalhador, mas não é para a previdência. É para manter a proteção aos abonos do desemprego e ser um fundo de investimento para geração de empregos. O BNDES administra os recursos do FAT constitucional. O FAT tem que ser preservado como um fundo público para investimento e proteção ao trabalhador. A previdência não pode pode estar vinculada ao fundo de investimento, tem que estar vinculada às despesas previdenciárias e quando você desvincula da folha de pagamento, tem que dizer onde estará ancorada.

Conselho do FGTS

Haverá mudanças no saque-aniversário do FGTS?

Vamos buscar corrigir uma injustiça que tem com os correntistas que foram demitidos e que recorreram ao saque-aniversário, à alienação de parcela do seu fundo assim e que estão impedidos por lei de sacar o seu saldo. Terá que ser por lei. Estamos trabalhando para [apresentar] uma proposição na retomada do Congresso. Tem trabalhador com R$ 30 mil, R$ 40 mil, R$ 50 mil de saldo no seu FGTS sem dívida contratada por meio do saque-aniversário ou empréstimo consignado junto a uma instituição financeira, mas é proibido de sacar o saldo. É uma grande ansiedade de milhares de pessoas que foram demitidas e não puderam socorrer do seu patrimônio depositado ao Fundo de Garantia. 

O Conselho pode aumentar o valor do financiamento do Minha Casa, Minha Vida paulatinamente? 

À medida que tiver a condição, a demanda de mercado e a orientação do presidente [Lula], o Conselho analisa as possibilidades de aumentar esse valor. Mas eu creio que o valor [dos financiamentos] que aumentamos já está bastante razoável.

Fale-se na liberação de R$ 20 bilhões em recursos do fundo para subsidiar o MCMV. Essa liberação pode ser tomada em julho?

Os grupos de trabalho ainda estão discutindo, pode ser que tenha alguma coisa. Mas não me parece que tenha na próxima reunião algo parecido.

A distribuição de lucro do FGTS será anunciada em julho?

A distribuição do lucro líquido para os correntistas, se você observar de 2016 para cá, todo ano no mês de julho, ou mais tardar em agosto, tem a decisão do conselho de qual é o valor do lucro do do exercício anterior do fundo que é distribuído nas contas proporcionalmente ao valor de cada conta dos correntistas. Essa decisão sobre a distribuição dos lucros nós vamos tomar agora na próxima reunião do conselho.