Magistrado entendeu que foi clara a intenção em descumprir a lei com programa 'Escola Mais Bonita' e anulou regra que mandou pintar escolas com as cores definidas. Cabe recurso.
Por G1 SP — São Paulo
A 7ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo condenou o ex-governador João Doria (PSDB) e o secretário da Educação do Estado, Rossieli Soares, por causa do programa "Escola Mais Bonita", que previa a pintura de 40% das instituições da rede estadual nas cores azul e amarelo, símbolo do PSDB. O caso foi revelado pelo g1SP.
O magistrado entendeu que foi clara a intenção deles em descumprir a lei e anulou a determinação de Doria que mandou pintar escolas com as cores do PSDB. "Enfim, o dinheiro público não pode e não deve ser utilizado para atender anseios próprios, de nítida coloração partidária", escreveu o juiz Emilio Magliano Neto.
Doria e Rossieli devem dividir os custos de R$ 10 mil do processo. Ainda cabe recurso. O g1 procurou o posicionamento do ex-governador e aguarda resposta.
Em março de 2020, Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo já havia mantido uma decisão da primeira instância que impedia João Doria de exigir que 2,1 mil escolas do estado pintem suas fachadas predominantemente de azul e amarelo e que comprassem as tintas de três marcas definidas sem processo licitatório.
Em 2019, o governo de São Paulo enviou orientações, por meio do Manual de Pintura, às escolas participantes do Projeto Escola Mais Bonita, para que pintassem suas fachadas com as cores do PSDB, conforme antecipou o g1.
Governo de SP suspende orientação para pintar fachadas das escolas de azul e amarelo
Escola 'mais bonita'
Lançado pelo governador João Doria em janeiro de 2019 prevendo a revitalização da pintura de 2,1 mil escolas estaduais de São Paulo, o programa “Escola Mais Bonita” só começou a ser implementado de fato em junho e reduziu o número de escolas envolvidas para 1.384.
O programa funciona por meio de convênio da Secretaria Estadual da Educação com a Fundação para Desenvolvimento da Educação (FDE) e previa obras de reforma nas unidades atendidas, dentre elas a pintura dos prédios. O orçamento total de R$ 1,1 bilhão inclui o gasto com tintas nas cores do partido do governador, o que caracteriza uso indevido de recursos públicos.
O deputado estadual Emidio de Souza protocolou uma representação na Procuradoria-Geral de Justiça do Estado (PGE) contra João Doria por improbidade administrativa por causa do mesmo projeto de pintura das escolas.
O "Manual de Pintura – Escolas Estaduais Paulistas 2019" (veja abaixo) encaminhado às escolas demonstra com fotos e gráficos como as escolas devem ser pintadas. Nas fachadas, além do branco, é exigido que as cores azul e amarela sejam destacadas, sendo 30% azul e 10% amarelo.
Com este manual, foi encaminhado às escolas o "Manual de Instrução - Utilização da verba e elaboração da prestação de contas - Programa Escola Mais Bonita" em julho deste ano, que diz que os serviços de pintura devem ser realizados de acordo com as orientações contidas no Manual de Pintura (veja abaixo).
O manual de instrução também diz que "o valor recebido para contratação de serviços não poderá ser utilizado em aquisição de materiais de consumo e vice-versa". A reclamação dos professores é a de que há outras prioridades nas escolas, como merenda e computadores.
Apesar da orientação, a secretaria disse, por meio de sua assessoria de imprensa e por telefone na ocasião da publicação da primeira reportagem, em novembro, que a verba pode ser usada para qualquer necessidade que a escola tenha.
Em nota daquele ano, a Secretaria da Educação do Estado de SP disse que "não procede a informação de que as escolas da rede estadual estão sendo pintadas nas cores azul e amarela. O Projeto Escola + Bonita, que tem o objetivo de revitalizar os prédios das escolas públicas, utiliza o amarelo, verde, azul, branco, concreto e areia".
O uso de outras cores em um prédio do governo já foi polêmica em maio deste ano. As salas do Palácio dos Bandeirantes, sede do governo de São Paulo, foram pintadas de preto e cinza. Na época, o governador disse que pretendia alugar alguns espaços para a realização de eventos. O Ministério Público abriu inquérito civil para apurar as modificações feitas pelo governo.
De acordo com um professor que prefere não se identificar, o Centro de Educação de Jovens e Adultos do Estado (CEEJA), de Mogi das Cruzes (SP) recebeu o valor de R$ 17,5 mil em setembro como verba direcionada para material de pintura.
"O governo alega que o estado está sem dinheiro em caixa para a educação, mas libera essa verba para a pintura que nem é a prioridade. Nas cinco escolas em que leciono, apenas duas têm sala de leitura, de informática e laboratório adequado e nas outras faltam sala de informática, computadores e até mesmo limpeza nos terrenos", afirma.
Para o professor, a prioridade do CEEJA, além das já citadas, é a merenda para os alunos. De acordo com ele, algumas escolas, inclusive, já receberam verba para pintura no início do ano. A nova verba, contudo, tem de ser usada para nova pintura ou ser devolvida (verba direcionada).
"Esse gasto vai na contramão de quem diz que quer eficiência e deseja reduzir despesas, já que as escolas já ganharam verbas de pinturas de início de ano letivo e esse dinheiro poderia ser investido em melhorias na infraestrutura como acessibilidade para pessoas com deficiência, melhorar a qualidade da merenda e melhorias em equipamentos tecnológicos. Em campanha o governador disse que queria a educação totalmente ligada à tecnologia e à era da informação, mas ainda há escolas em que nem o wi-fi funciona direito."