
Os programas de acompanhamento a adolescentes e jovens após o cumprimento de medidas socioeducativas (Pós-MSE), política fomentada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) com apoio do Programa Fazendo Justiça, existem em 15 unidades da federação, mas apresentam uma série de desafios. O Relatório de Monitoramento dos Programas Estaduais de Acompanhamento a Adolescentes Pós-cumprimento de Medida Socioeducativa, lançado hoje, aponta desde a escassez de recursos humanos e financeiros até a falta de regulamentação.
O levantamento foi realizado entre julho e dezembro de 2023, a partir de formulário eletrônico enviado aos órgãos gestores estaduais do sistema socioeducativo. Responderam 25 estados e o Distrito Federal, com exceção do Amapá.
Do total, 12 relataram programas implementados — Alagoas, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Mato Grosso, Minas Gerais, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Sul, Sergipe e Tocantins —, enquanto o Distrito Federal descreveu experiência piloto. Entre essas, apenas sete (Bahia, Ceará, Espírito Santo, Minas Gerais, Pernambuco, Rio Grande do Sul e Tocantins) formalizaram a política por meio de normativas estaduais. Outros dez estados informaram estar em tratativas para implementação e três ainda não iniciaram o processo.
Após o período do levantamento, três estados firmaram acordos de cooperação técnica com o CNJ para implementar o programa: Pará (2024), Rio Grande do Norte e Paraíba (2025).
Desafios
O relatório identifica dificuldades comuns aos estados, como a insuficiência de recursos humanos e financeiros e a baixa capilaridade, com concentração das ações nas capitais. A maioria dos programas funciona com equipes muito reduzidas, em geral com menos de dez profissionais, o que limita a capacidade de atendimento. Também há problemas na distribuição territorial: em 69% dos estados o Pós-MSE tem abrangência estadual, mas em quatro unidades — Ceará, Pernambuco, Piauí e Amazonas — a atuação permanece restrita à capital ou à região metropolitana.
A ausência de informações regulares sobre a atuação junto às famílias é outro ponto crítico: em mais de um quarto das respostas, as unidades da federação relataram não desenvolver atividades específicas para esse público, apesar de sua relevância no processo de desligamento do sistema socioeducativo.
Também foram registradas inconsistências nos dados enviados, o que compromete a compreensão plena sobre o público atendido, os encaminhamentos realizados e os orçamentos destinados. “Acompanhar adolescentes que passaram pela socioeducação é fundamental para que o retorno ao convívio familiar e social aconteça de forma segura, e que esse ou essa jovem trilhem novos caminhos a partir dali. O relatório mostra que ainda há um longo caminho a percorrer, mas também evidencia que já existem estruturas capazes de orientar a consolidação dessa agenda em âmbito nacional”, afirma o juiz coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF), Luís Lanfredi.
Entenda o programa
O Pós-MSE tem como objetivo apoiar adolescentes e jovens após o cumprimento de medidas de internação ou semiliberdade, em caráter voluntário, garantindo acesso a direitos e condições para construção de novos projetos de vida. Diferentemente da etapa de responsabilização, o acompanhamento não é uma sanção, e sim uma política de suporte e proteção, articulada com a rede de serviços públicos nos territórios.
Entre suas funções estão a articulação de políticas públicas para assegurar cidadania, o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários, o apoio ao projeto de vida dos adolescentes, além da promoção de acesso à educação, ao trabalho, à saúde, ao esporte, à cultura e ao lazer. O programa também busca envolver as famílias no processo.
O atendimento é organizado em fases que vão desde a sensibilização no momento de saída do sistema socioeducativo, passando pelo acompanhamento individual e coletivo com oficinas e grupos, até o desligamento, quando são reforçados os encaminhamentos para serviços locais e redes de apoio.
O relatório mostra que a maioria dos estados instituiu seus programas a partir de 2009, período posterior à publicação da Resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente n. 119/2006, que estabeleceu diretrizes para o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase) e incluiu a previsão do acompanhamento pós-medida. O movimento cresceu com a Lei Federal n. 12.594/2012, que instituiu o Sinase, e com o Plano Nacional de Atendimento Socioeducativo de 2013, que induziu planos estaduais e municipais.
Metade dos programas em funcionamento foi criada a partir de 2019, coincidindo com a atuação do CNJ na indução e qualificação das iniciativas. Entre as ações de apoio, destaca-se a publicação do Guia para Programa de Acompanhamento a Adolescentes Pós-cumprimento de Medida Socioeducativa de Restrição e Privação de Liberdade (2020–2021), para orientar gestores estaduais.

Entre os encaminhamentos sugeridos, o relatório destaca a necessidade de fortalecer a cultura de coleta e análise de dados sobre os programas, com informações mais consistentes sobre perfil do público, recursos orçamentários e resultados alcançados. Também aponta como estratégico o apoio dos Tribunais de Justiça e de outros atores do Sistema de Garantia de Direitos para fomentar a implementação e qualificação da política, garantindo financiamento adequado e continuidade das ações.
Outras medidas incluem a inclusão dos Programas Pós-MSE nos Planos Plurianuais (PPAs), para assegurar caráter permanente e financiamento estável, e a possibilidade de destinação de recursos de fundos de penas pecuniárias, conforme previsto na Resolução CNJ n. 558/2024.
Agência CNJ de Notícias
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