14 de março de 2025, 12h23

No ano passado, o número de novas ações na Justiça do Trabalho passou de 2 milhões, marca que não havia sido atingida desde 2017, quando foi aprovada a reforma trabalhista. Ao todo, foram 2.117.545 novos processos em 2024, um aumento de 14,1% em relação a 2023. A série histórica revela que houve uma queda nas ações depois da aprovação da reforma trabalhista, que dificultou a busca dos trabalhadores por seus direitos e privilegiou acordos diretos entre empresas e empregados [1].

São várias as causas do aumento das ações trabalhistas na Justiça do Trabalho. A primeira e mais importante é o descumprimento de direitos básicos, direitos elementares dos trabalhadores, como o pagamento da multa de 40% do FGTS, o pagamento de verbas rescisórias, o pagamento de horas extras, o pagamento de adicional de insalubridade, por exemplo.

Então, se empresas, no pleno século 21, não cumprem direitos elementares dos trabalhadores, parte desses, depois de rescindidos os contratos de trabalho, vai ao Judiciário buscar o que lhe pertence.

Sim, o reconhecimento da gratuidade da justiça para quem tem esse direito, pelo Supremo Tribunal Federal, impactou na percepção de risco dos trabalhadores, que se sentem lesados na hora de avaliar se entra ou não com um processo contra a empresa. Quando a reforma trabalhista de 2017 retirou esse direito fundamental, constitucional, o número de ações diminuiu, não porque deixaram de existir suas causas, mas, pelo medo dos trabalhadores de serem condenados a pagar despesas processuais e honorários para os advogados das empresas.

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A precarização dos contratos e condições de trabalho também são fatores que ajudam no aumento das ações trabalhistas, e o próprio STF vem contribuindo para tanto, permitindo a ampliação da chamada “pejotização” nas relações de trabalho. São muitos os casos em que a Justiça do Trabalho reconhece vínculo de emprego nessas situações e o STF anula as decisões, sem sequer apreciar as questões fáticas e os verdadeiros requisitos da relação de emprego. Então, o STF também é parte do aumento da litigiosidade na Justiça do Trabalho.

A grande rotatividade no mercado de trabalho ajuda a aumentar as ações trabalhistas, porque, como é sabido, os trabalhadores, como regra, somente reclamam seus direitos quando saem das empresas, com medo de retaliações dos ex-empregadores, inclusive sobre a busca de novo emprego.

O enfraquecimento dos sindicatos pela reforma trabalhista de 2017 também é fator motivador das ações trabalhistas, retirando sua principal fonte de custeio das atividades sindicais, porque sem dinheiro os sindicatos não podem bem cumprir seu papel de defesa dos trabalhadores. Sindicato enfraquecido não fiscaliza as condições de trabalho e o cumprimento dos direitos dos trabalhadores, o que aumenta as demandas na Justiça do Trabalho.

A reforma trabalhista de 2017, na ânsia de eliminar direito dos trabalhadores, acabou com a obrigatoriedade da homologação das rescisões contratuais nos sindicatos. Na homologação da rescisão contratual no sindicato, há supervisão sobre o cumprimento dos direitos dos trabalhadores, homologações podem ser suspensas e as empresas passam a respeitar mais os direitos dos trabalhadores, evitando a judicialização na Justiça do Trabalho.

Soluções

Muitos falam que é preciso diminuir o número de processos na Justiça do Trabalho, o que está absolutamente correto. Todavia, o remédio para tanto não pode ser a retirada e diminuição de direitos dos trabalhadores e a criação de dificuldades ao acesso ao Judiciário, como tem sido a tônica nos últimos anos, principalmente a partir da reforma trabalhista de 2017.

Então, como diminuir o número de ações na Justiça do Trabalho? As soluções são simples e basta querer resolver o problema, sem prejudicar os trabalhadores.

Algumas soluções são: diminuir o inadimplemento das obrigações trabalhistas, fazendo com as empresas cumpram os direitos básicos trabalhistas (por que não se faz campanhas de esclarecimentos e incentivo às empresas, que não pagam os direitos dos trabalhadores?!), fortalecer os sindicatos, para que voltem a ter papel mais incisivo na fiscalização do cumprimento dos direitos dos trabalhadores, voltar a obrigatoriedade da homologação das rescisões contrafactuais nos sindicatos, criar mecanismos alternativos de solução de conflitos trabalhistas perante as partes, como, por exemplo, resgatar a criação das Comissões de Conciliação Prévia por sindicatos e empresas (artigo 625-A da CLT). Essas comissões, se não desvirtuadas, podem resolver muitos conflitos entre empregados e empregadores e, assim, evitar o ajuizamento de ações trabalhistas

Também é preciso acabar as políticas de desregulamentação das relações de trabalho, sob o falso argumento da criação de mais empregos, porque empregos se cria com melhora da economia, como hoje está ocorrendo Brasil, que atingiu o menor índice de desemprego na série iniciada em 2012 (6,6% em 2024).

Se não se combater as causas verdadeiras das ações trabalhistas e não se criar meios alternativos para a solução de conflitos trabalhistas, não tem jeito: o número de ações estará sempre aumentando na Justiça do Trabalho, que tem o papel exatamente de resolver os conflitos e assegurar o cumprimento das leis do trabalho, não podendo ser acusada de culpada por tal aumento. Culpado mesmo é quem, no século 21, não cumpre direito básicos dos trabalhadores, como, por exemplo, o pagamento de horas extras e verbas rescisórias! É isso!

 


[1] https://sindpd.org.br/2025/02/13/acoes-justica-do-trabalho/ – acesso em 20/2/2025

  • é professor titular do Centro Universitário UDF/Mestrado em Direito e Relações Sociais e Trabalhistas, membro da Academia Brasileira de Direito do Trabalho, doutor em Direito das relações sociais pela PUC-SP, consultor jurídico, advogado, procurador regional do Trabalho aposentado e autor de livros jurídicos, entre outros, Ação Civil Pública na Justiça do Trabalho.

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