No litoral de São Paulo, criminosos usavam central de câmeras para monitorar a polícia.
No litoral de São Paulo, criminosos usavam central de câmeras para monitoramento| Foto: Polícia Civil/Divulgação
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Usadas na proteção de espaços comerciais, residências e pela segurança pública, as câmeras de monitoramento se popularizaram no país e com o avanço tecnológico se tornaram mais acessíveis tanto no preço como na operação. No entanto, o setor de segurança passa a conviver com um efeito colateral da vigilância. De Norte ao Sul do Brasil, os criminosos utilizam os equipamentos como "olhos do crime" para espiar o trabalho dos policiais durante as rondas e as operações.

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A identificação e remoção dessas câmeras, instaladas em vias públicas para servir a criminosos, coloca a segurança pública no front de uma guerra tecnológica. Um levantamento da Gazeta do Povo, baseado em dados das forças de segurança estaduais, revelou que centenas desses equipamentos foram retirados de operação no primeiro semestre deste ano.

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“Além de retirar o aparelho, é fundamental identificar o centro de comando e controle para desarticular essa estrutura. Caso contrário, o aparelho será substituído por outro, devido ao seu baixo custo e acessibilidade. É crucial localizar os criminosos responsáveis pelas instalações e operações”, alertou a Polícia Federal em operação na fronteira do Brasil com o Paraguai.

Em Foz do Iguaçu (PR), na fronteira entre os dois países, criminosos monitoram ações policiais para se protegerem de possíveis operações e rondas. A cidade é um importante reduto de criminosos envolvidos no tráfico nacional e internacional de drogas, fomentado por entorpecentes traficados do Paraguai pelas maiores facções brasileiras, como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV).

No início deste ano, a Polícia Civil identificou uma câmera estrategicamente instalada em um poste de iluminação pública, que, além das transmissões em tempo real, possuía cartão de memória para armazenamento das imagens por dias. Outras câmeras suspeitas foram apreendidas, com o mesmo objetivo de monitorar ações das forças de segurança.

Além da instalação em comunidades e bairros estratégicos para o crime organizado, a Polícia Federal alerta para o uso de dispositivos de monitoramento no rio Paraná, observando as embarcações que operam na fiscalização do rio que divide Brasil e Paraguai. O canal na fronteira é uma das principais rotas usadas pelo crime organizado para o contrabando e o tráfico de drogas. “Além dos olheiros, pessoas que cuidam da movimentação dos policiais, há monitoramento por câmeras do rio”, reforça a PF.

A vigilância do crime também se acentua em bairros na região da Ponte Internacional da Amizade, que liga Foz do Iguaçu a Cidade do Leste, por onde passam cerca de 80 mil pessoas e 40 mil veículos circulam, diariamente, entre os países vizinhos.

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A fronteira mais movimentada do Brasil é vigiada por grupos criminosos interessados no monitoramento da Polícia Rodoviária Federal (PRF), da Polícia Federal e da Receita Federal, órgãos de segurança responsáveis pelas operações mais intensas de fiscalização.

“É um desafio localizar as centrais de controle para desmantelar os sistemas”

Outra metodologia do crime, mas que está em declínio, segundo a PF, é a utilização de drones para vigilância e transporte de mercadorias ilegais entre os países. “Como a capacidade dos drones para o transporte de mercadorias é pequena, acaba não sendo tão vantajoso, mas existe. Por outro lado, as câmeras de vigilância são mais efetivas, indicando o momento mais tranquilo para as travessias do Paraguai para o Brasil”, indica.

Câmeras vigiam movimentos da polícia na Baixada Santista para crime organizado

No Guarujá (SP), na Baixada Santista, policiais militares identificaram câmeras de vigilância em uma comunidade durante uma operação no início deste ano. Os equipamentos foram retirados e destruídos, sendo que os políciais foram criticados após serem filmados durante a remoção do sistema.

Segundo a Polícia Militar, os equipamentos eram usados pelo crime para monitorar as forças de segurança e os policiais têm autonomia para remoção dos aparelhos, caso se observe que os equipamentos são usados para ações ilegais.

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Além disso, no último mês de março, um centro de monitoramento instalado pelo PCC foi destruído na cidade de Santos (SP), no litoral paulista. Segundo a Polícia Civil, eram 13 câmeras monitorando pontos de tráfico de drogas. Uma operação comandada pela 1ª Delegacia de Investigações Criminais do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) cumpriu 10 mandados de busca e apreensão em estruturas usadas pela facção. Em um dos endereços funcionava o centro de operação e controle das câmeras, que foram removidas com o auxílio da Companhia Paulista de Força e Luz (CPFL).

Com viaturas caracterizadas, prisões e apreensões em queda

No Norte do Brasil, em Belém, capital do Pará, a Polícia Militar desconfiou do comportamento dos criminosos durante operações em áreas dominadas pelo crime organizado. A corporação disse que “tinha a sensação que os criminosos sabiam da aproximação policial”. E, realmente, eles sabiam. No mês passado, a PM identiificou e removeu câmeras instaladas em postes de iluminação pública nos acessos aos bairros, onde o crime organizado tem forte atuação.

No Sudeste, em Resende (RJ), o esquema audacioso de criminosos entrou na mira da polícia após a redução considerável de flagrantes em regiões dominadas por traficantes ou com alta incidência de crimes. O que despertou a atenção da PM era que os flagrantes só caíram durante as rondas com viaturas caracterizadas. Com uso dos carros sem a identificação tradicional, as abordagens, apreensões e prisões seguiam em alta.

Com o serviço de inteligência, a PM do Rio de Janeiro iniciou uma varredura pela região e, em junho, localizou 18 câmeras, todas instaladas em postes de iluminação pública. O sistema de monitoramento cobria quatro regiões da cidade. O Ministério Público do estado apura investiga o uso das imagens pelo crime organizado e a localização da central de monitoramento.

Operações localizam câmeras de criminosos que vigiavam policiais

Em abril, o Departamento de Polícia Metropolitana de Salvador (BA) realizou uma operação para retirada de dispositivos instalados em estruturas de iluminação pública para vigiar a polícia na capital baiana. A corporação não confirmou quantas câmeras foram apreendidas, mas outras três operações foram realizadas em 2024. Além dos casos em Salvador, houve registros de câmeras apreendidas em Jequié e São Gonçalo do Retiro no estado.

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No Rio Grande do Norte, a Polícia Civil fez uma operação em junho para desmantelar um grupo criminoso que usava câmeras de monitoramento para vigiar e se proteger das ações policiais. Cinco pessoas foram presas e um adolescente foi apreendido, suspeito de envolvimento no esquema na região metropolitana de Recife.

Instalações de câmeras reforçam crime de associação ao tráfico ou organização criminosa

De acordo com o advogado e procurador-jurídico nacional da Associação Nacional da Advocacia Criminal (Anacrim), Márcio Berti, a implantação e monitoramento de sistemas de vigilância por criminosos pode aumentar a pena no caso de identificação dos responsáveis e posterior condenação. “Isso pode influenciar tanto na fixação da pena base quanto reforçar a acusação de associação para o tráfico ou organização criminosa”, destaca Berti.

Ele lembrou que o artigo 29 do Código Penal Brasileiro trata da coautoria e participação em crimes, estabelecendo que quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas na medida de sua culpabilidade. “No contexto de instalação de câmeras para monitorar a ação policial por criminosos, essa conduta pode ser enquadrada como participação ou coautoria, caso fique comprovado que a pessoa agiu com o intuito de facilitar a prática de crimes ou impedir a ação da Justiça”, reitera.

O advogado alerta que o cidadão comum também pode ser penalizado pela instalação de câmeras de monitoramento em espaços públicos ou utilização de postes e estruturas de iluminação pública sem as devidas autorizações.

“Para um cidadão comum que instale câmeras sem autorização em postes de iluminação pública ou outros locais públicos, o uso indevido dessas imagens ou a instalação com objetivos ilícitos também pode ser enquadrado no artigo 29 do Código Pena, caso seja demonstrado que a instalação das câmeras tinha o propósito de contribuir para a prática de algum crime ou proteger ações ilícitas”, reforça.

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A instalação de câmeras em locais públicos envolve diversas questões legais e técnicas e, comumente, é feita por órgãos de segurança pública ou segurança viária, vetada para fins particulares.

Quando se trata de estrutura de iluminação pública, a instalação precisa passar por autorizações dos serviços municipais e da concessionária que opera o serviço. “Qualquer instalação de dispositivos de vigilância em espaços públicos deve ser feita de acordo com a legislação e com as autorizações necessárias, evitando envolvimento em práticas que possam ser interpretadas como participação em atividades criminosas”, completa.