quinta-feira, 16 de maio de 2019

Meninas da Fundação Casa participam de oficina sobre empreendedorismo

Meninas da Fundação Casa participam de oficina sobre empreendedorismo

Edição do "Women Will" apresenta nova perspectiva de vida para jovens mulheres que estão ou já passaram por medidas socioeducativas

“Meu pai tirou a minha virgindade”. A frase chocante foi dita por B.* na segunda-feira (13) durante edição do Women Will, iniciativa privada de capacitação do Google que, em parceria com a Rede Mulher Empreendedorae apoio do Instituto Mundo Aflora, se dedica a treinar meninas que estão ou já passaram por medidas socioeducativas na Fundação Casa.
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Assim como outras jovens que participam do programa, B. tem uma história dolorida, mas aos poucos está conseguindo dar a volta por cima. Aos 13 anos, ela saiu de casa onde morava com o pai e com a madrasta. Lá, conta, sofria uma série de abusos sexuais. “Meu pai começou a mexer comigo aos 8 anos de idade e ele só parou aos 12, quando eu virei mocinha”, revelou à CLAUDIA.
 B., de 18 anos
B., de 18 anos (CLAUDIA/CLAUDIA)
“Naquele momento, eu não tinha a minha mãe por perto. Não tinha um primo, não tinha uma tia. Então eu comentei com a minha madrasta e ela não gostou. Por eu ser enteada dela, ela já não gostava de mim. Então quando eu contei, ela falou que era mentira, que eu estava inventando e me botou para fora de casa.”
Desde então, B. busca sua independência e tenta estruturar a vida sozinha. Uma pedra no caminho, no entanto, fez com que ela fosse parar na unidade de Chiquinha Gonzaga, na Mooca, Zona Leste de São Paulo.
Eu sempre levei comigo que o que eu passei foi uma fase. Acabei sendo uma cabeça dura e me deixei levar por palavras, por momentos”, conta.

Histórias e sonhos

No total, estão participando desta edição do Women Will 27 meninas da Fundação Casa, sendo 15 em internação ou regime de semiliberdade nas unidades Taipas e Chiquinha Gonzaga, e 12 que já estão em liberdade e foram indicadas pelo Instituto Mundo Aflora.
M. M., de 18 anos.
M., de 18 anos. (CLAUDIA/CLAUDIA)
M. é outra delas. Aos 18 anos, a jovem enfrenta sua segunda internação na Fundação Casa, na unidade de Taipas. A primeira aconteceu quando tinha 15 anos, na unidade Chiquinha Gonzaga.
Lá dentro, M. soube aproveitar os cursos oferecidos pela fundação e se dedicou aos estudos. Em 2018, prestou o ENEM e, atingindo uma boa nota na redação, ingressou na universidade para estudar Serviço Social. “Eu quero trabalhar com meninas que estão passando por medidas socioeducativas e mostrar a elas que se eu consegui superar as dificuldades, elas também conseguirão”, revela.
Criada no Jabaquara, zona sul de São Paulo, M. cresceu em uma família desestruturada. A mãe é usuária de drogas e o pai, distante. Apesar das dificuldades, sonha com um futuro melhor. “Eu acho que as dificuldades me tornaram mais forte”, afirma.
 J., de 15 anos.
J., de 15 anos. (CLAUDIA/CLAUDIA)
Assim como M., J., de 15 anos, também está na Fundação Casa, mas em regime de semiliberdade. Ela tem o direito de ir à escola e visitar a família aos finais de semana, em São José do Rio Preto, no interior de São Paulo, sua cidade natal.
Além da escola, a garota faz um curso de administração e quer trabalhar com marketing futuramente. Seu sonho é atingir a estabilidade financeira e viajar o mundo. “O lugar que eu mais quero conhecer é a Grécia”, conta.

Empoderamento e perspectiva: como funciona o programa

Durante quatro dias de treinamento presencial, com início na segunda-feira (13) e término nesta quinta (16), o Women Will apresenta uma agenda pensada especificamente para o empreendedorismo feminino com linguagem adaptada para as meninas participantes.
Entre os temas escolhidos destacam-se assuntos como ferramentas digitais, negociação, autoimagem, liderança feminina, empregabilidade na prática, técnicas de relaxamento e controle emocional, segurança e marketing digital. Com isso, as jovens serão incentivadas a desenvolver novas habilidades técnicas, comportamentais e pessoais e a desenvolver a independência financeira.
“A grande missão do Women Will é deixar essas mulheres fortes e empoderadas para que elas achem a sua oportunidade econômica e se desenvolvam”, explica Maria Helena Marinho, gerente de insights do Google e líder do programa.
Em parceria com a Rede Mulher Empreendedora, o Google escolheu funcionários da empresa e mulheres que já passaram por medidas socioeducativas da Fundação Casa. Eles irão compartilhar suas experiências pessoais para incentivar as aprendizes.
“A grande questão da grade é o empoderamento psicológico para que ela [a aprendiz] se sinta segura para fazer o que ela quiser. Independente do tipo de atividade que ela queira fazer, a gente quer que ela se inspire a se reconectar consigo mesma, se sinta forte e entenda que ela tem capacidade”, completa Marinho.

Abrir a mente

Meninas no Women Will Meninas no Women Will
Meninas no Women Will (Iara Barbosa/RME/Divulgação)
Ana Fontes, fundadora da Rede Mulher Empreendedora, afirma que o objetivo é dar às meninas possibilidade para sonharem. “O que a gente quer de verdade é mostrar que elas podem, ajudando-as a dar o próximo passo”, conta.
“A gente tem que reforçar muito que existe perspectiva. Elas ficam abandonadas quando vão para essas instituições. Então é muito importante mostrar a elas que há perspectiva, que elas podem seguir uma vida diferente”, ressalta Fontes.

Recomeço

Atualmente, B. mora sozinha, em Paraisópolis, na Zona Sul da capital paulista, e está prestes a começar a trabalhar como operadora de loja em um supermercado. Seu maior sonho é tornar-se advogada e, futuramente, juíza.
Assim como as outras meninas, participar do Women Will abriu sua mente e visão sobre o futuro. “A determinação e a força de vontade são coisas novas, são ares novos. Eu entendo que é uma nova oportunidade de ver o mundo de uma nova maneira”, diz. Quando você tem a oportunidade de conversar com empreendedoras, como estou tendo hoje, suas ideias e seus pensamentos mudam”, opina J. 
Já M. acredita que o programa quebra o estigma existente em torno de meninas que passam por medidas socioeducativas. “As pessoas ainda veem a gente como meninas que são criminosas. Mas aqui elas não nos olham como se tivéssemos problemas. É muito produtivo e traz garra.”
*Os nomes foram ocultados para preservar a identidade das entrevistadas

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