Paulo Saldaña
BRASÍLIA
O governo Jair Bolsonaro (PSL)tem trabalhado para criar uma carteira de identificação de estudantes com o objetivo de esvaziar a carteirinha emitida por entidades estudantis. O documento, que garante meia entrada em cinemas e espetáculos, é a principal fonte de renda dessas organizações.
O projeto é discutido desde a transição, segundo a Folha apurou. A viabilização coube ao Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), órgão ligado ao Ministério da Educação, em parceria com a secretaria executiva do MEC.
A iniciativa passa pela criação de um aplicativo de identificação de participantes nos exames e avaliações, como o Enem. Pelo aplicativo, estudantes poderão emitir uma carteirinha eletrônica a partir de identificação com o CPF.
A ideia é começar o cadastro por alunos do ensino superior. Em um segundo momento, abrir adesão para estudantes de outras etapas. O Inep detém as bases de dados da educação brasileira, a partir das quais haveria a viabilização do projeto.
Os detalhes técnicos do aplicativo já estão prontos. A Folha apurou que uma equipe do Inep trabalhava nos últimos dias com o layout da carteirinha.
O trabalho foi tocado pelo ex-presidente do Inep, Marcus Vinicius Rodrigues, que elegeu o tema como uma das prioridades dos primeiros 100 dias de governo. A demissão de Marcus Vinicius do instituto em meio à crise que culminou com a saída Ricardo Vélez Rodríguez —substituído por Abraham Weintraub— acabou atrasando o anúncio oficial do projeto.
MEC e Inep não responderam aos questionamentos da reportagem.
Bolsonaro e aliados são rivais da UNE e outras entidades estudantis. Deputados do partido do presidente tentam emplacar uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) na Câmara para investigar a organização e sua relação com governos do PT. A UNE é dominada há anos pelo PCdoB.
A aceitação da carteirinha feita pelo MEC esbarra na legislação. Uma lei de 2013, sobre o benefício do pagamento de meia-entrada, garante a emissão apenas à UNE (União Nacional dos Estudantes), à Ubes (União Nacional dos Estudantes Secundaristas) e à ANPG (Associação Nacional de Pós-Graduandos).
Em 2015, decisão do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, entendeu que o documento também pode ser feito por entidades estudantis municipais e estaduais, sem vínculo necessário aos órgãos de âmbito nacional.
O plano do MEC, entretanto, é que estabelecimentos passem a aceitar a identificação oficial aos poucos. O governo não descarta uma futura tentativa de alterar a lei de meia entrada dentro do Congresso.
Para o presidente da Ubes, Predro Gorki, a iniciativa é uma forma de o governo afrontar as entidades, já que se trata de uma das principais formas de financiamento do movimento estudantil.
“A gente defende que as organizações da sociedade civil, não o Estado, garantam a meia entrada. Seria uma interferência do Estado”, diz Gorki, que ressalta a garantia da legislação federal.
Antes da lei de 2013, sancionada pela presidente Dilma Rousseff (PT), houve uma medida provisória, em 2001, que abria a possibilidade de comprovação estudantil a partir de documento confeccionado pelas próprias instituições de ensino.
Na época, a UNE argumentou que se tratava de retaliação do governo Fernando Henrique Cardoso às mobilizações da entidade por melhorias na educação. Com a lei de 2013, a medida provisória foi revogada.
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