sexta-feira, 15 de dezembro de 2023

A gestão da Fundação Casa deve ser concedida à iniciativa privada? SIM


É possível buscar metas; experiências internacionais apresentam bons resultados na reinserção social

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MARIANA CHIESA GOUVEIA NASCIMENTO

Doutora em direito do Estado (USP), é professora da graduação em direito do Insper e da pós-graduação da FGV; sócia da Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Sociedade de Advogados

De pronto, tanto o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) como o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo preveem a gestão privada do atendimento socioeducativo, destacando ser indispensável a participação dos diversos segmentos da sociedade na execução dos objetivos da política pública.

Portanto, não estamos diante de algo estranho ao atendimento a adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas. Então por que o assunto ganha tantas camadas de oposições?

Internos da Fundação Casa, em São Paulo - Rivaldo Gomes -23.ago.21/Folhapress - Folhapress

Isso se dá pois o debate acaba contaminado por uma série de pressupostos equivocados. A tentativa de atribuir o problema ao modelo de prestação do serviço, direta pelo Estado ou em parceria com a iniciativa privada, é um deles. De um lado, os que demonizam gestão direta pelo Estado. De outro, os que o fazem olhando para a gestão pela iniciativa privada. Não há uma melhor solução em tese. A melhor solução parte de um diagnóstico concreto e de desenhos específicos de arranjo. E é nesse contexto que se insere a discussão sobre a concessão para a iniciativa privada da gestão da Fundação Casa.

Apesar de avanços que a municipalização do serviço e a descentralização da entidade trouxeram, o sistema apresenta problemas. Dados de 2018 indicam que mais de 65% dos jovens são reincidentes e 25% afirmam ter sofrido agressões dentro de unidades da Fundação Casa. São números que chocam.

A legislação avançou muito desde a Constituição para estruturar modelos de delegação que contam com a iniciativa privada na realização das tarefas públicas, incluindo serviços sociais. Tanto a iniciativa privada com finalidade lucrativa quanto as sem fins lucrativos. Em nenhum dos modelos o serviço deixa de ser público. Pelo contrário, o Estado centra esforços na regulação, no controle e na fiscalização da execução dos objetos contratados.

Os contratos de delegação permitem desde a conjugação de vários objetos em um só contrato até a autorização para remunerações atrelada ao desempenho. E o que cabe nesse desempenho? Tudo aquilo que pode ser medido. Claro que remunerar mais se houver mais jovens na instituição seria um equívoco.

Mas o modelo abre ampla possibilidade de estruturar indicadores qualitativos e envolver o privado na execução de metas para: reinserção social, capacitação profissional, efetiva individualização do Plano Individual de Atendimento (PIA), controle e responsabilização de agentes no cometimento de abusos, apoio psicológico aos profissionais da Fundação Casa, ampliação do acesso à cultura, trabalho com as famílias, manutenção dos edifícios etc.

O que não cabe é apequenar o debate e justificar a mudança na gestão com base na redução de custos, apenas. Veja que Minas Gerais vem modelando, em parceria com a ONU (Unops, Escritório das Nações Unidas de Serviços para Projetos), a primeira parceria público-privada no setor, sem perder de vista o adolescente. Outras PPPs no setor social também despontam pela qualidade, como a do Hospital do Subúrbio, em Salvador. No âmbito internacional, a iniciativa privada tem apresentado excelentes resultados em contratos de impacto social voltados à reinserção social.

Revisitar a forma de execução desse serviço é essencial, desde que não se perca de vista que a centralidade é a assistência ao adolescente.

TENDÊNCIAS / DEBATES
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